10 de novembro de 2021

 


O ESCRITOR E O PRISIONEIRO - RUTE SIMÕES RIBEIRO



"-Quem é miserável não sabe que é miserável?
 - Sabe, mas escolhe não ser, enquanto o for. Se um dia deixar de ser miserável, passará a ter pena dos que veja iguais ao que foi um dia."


É o segundo livro que leio da escritora e acabo sempre a pensar na relatividade das questões.
"O escritor e o prisioneiro", não tem espaço, nem tempo. Decorre numa sala de um consultório médico, e o prisioneiro não sabe se está louco ou não. 
A dúvida será porventura um sinal de sanidade?
E onde está a linha que separa essa nossa capacidade? Faço esta pergunta, um pouco à margem deste livro, ou desta história, porque os dias são rafeiros e a diferença entre uma coisa e outra nos rostos dos outros é cada vez mais ténue.
Provavelmente será uma ilusão minha, desesperança, desespero, fragilidade, mas os rostos estão efetivamente diferentes. Até o meu.

"... nos devêssemos todos preparar para um dia em que se dê sermos prisioneiros. E quem não esteja preparado, ainda lhe disse, corre o risco de não ter para que luzes olhar."
Ainda há parte deste livro, e que me desculpe a Rute Simões Ribeiro que mais uma vez fez-me pensar e desviar-me das linhas do seu livro, essa é a condição permanente do ser humano.
Presos a coisa nenhuma, iludidos em estradas sem sentido.
Já não olhamos o céu há muito, muito tempo.
Gostaria de ser um pouco mais distraída, mas por norma distraio-me mais com coisas supérfluas, como a lista do supermercado. Normalmente nunca acerto, entre aquilo que é preciso e aquilo que falta.

Perdoem-me! Desviei-me do essencial.
Que posso dizer! 
É dificil explicar. A essência deste livro é dificil de explicar. A essência deste livro é o próprio livro em si. O momento em que o escritor se confunde com o próprio assunto.
A obra criada para além das linhas que se preenchem de um caderno, da caneta que corre fugaz. 
Ele não é o outro, mas o próprio, prisioneiro do seu próprio ato de escrever. 
Ele está emaranhado naquelas linhas e elas são não a cópia de si mesmo, mas o seu próprio perfil.
O texto leva-nos a pensar, talvez até na nossa própria lucidez, talvez no nosso próprio aprisionamento.
Quem é escritor deve compreendê-lo muito bem, para mim foi o melhor momento para o compreender. 
O caminho em que duas estradas deixam de existir. 
Em que o escritor e a personagem se confundem, lado a lado, e deixa de ter competência para diferenciar a loucura da lucidez.
   

P.S - Gostaria de fazer uma ressalva nesta publicação. Este exemplar foi-me oferecido pela própria escritora ao qual eu estou profundamente grata. Não só a sua disponibilidade, mas também a sua gentileza e generosidade. Obrigada.



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