25 de setembro de 2021

 



UM QUARTO SÓ MEU (2)




 

O que é o luxo?

Aqui neste pequeno mundo meu, neste espelho redondo e enorme, o meu sonho é desmedido e profundo.

Aqui, eu desejo Castelos e Princesas. Desejo que a música nunca acabe e eu possa dançar com o meu vestidinho de seda e os meus pés descalços.

As minhas orelhas furadas com duas bolinhas de oiro são o meu luxo. O meu cabelo liso e cor do Sol poente. Os meus olhos castanhos presos ao espelho meu.
Diz-me, espelho meu! Existirá alguém, mais bonita do que eu?
Eu não quero dizer bonita! Quero dizer luxuosa. Interessante. Um quê de vaidosa.

Os meus vestidos de seda. Os meus olhos de menina regila.

 Escuta-me! Tenho sonhos. Um dia quero ser mulher sem o ser. Não quero ser mulher, quero ser a mulher.

Tenho sonhos de liberdade de escolha. Eu posso escolher? Posso, não posso?
Eu sei que posso escolher e não sou fútil. Os meus luxos não são sedas, veludos e sapatos de salto alto.
Os meus sonhos abarcam tudo o que é teu. Porque tudo o que é teu, um dia será meu. O teu poder não é eterno, mas o meu quando chegar, será!

Não me julgues mais. Fizeste-o em toda a humanidade.
Julgaste-me, aniquilaste-me, alienaste-me conforme a tua vontade.

 O que és tu, sem mim? Onde está o teu discernimento? A tua amabilidade? O teu amor? Tudo isso cresce dentro do meu corpo.

Ora aí está o meu maior luxo! Querer ou não amar-te.


23 de setembro de 2021

 


DEVOÇÃO - PATTI SMITH



A sério! Que revelações este mês.
Abri um pouco os olhos para os lados e descobri coisas novas e profundas. De repente sinto-me um pouco grata por isso.
Há mais vida para além do top de vendas das livrarias e dos sites online. 
Descobri que existem escritoras que eu tenho medo de explorar e que tem muita coisa para contar-me.
Descobri que a distância temporal do livro é uma pequena gota no meio do oceano da inspiração e descobri que tenho de deixar de ser arrogante, supersticiosa, implicativa e que se quero mesmo aprender alguma coisa terei de ter muita humildade.

Tentei pensar assim. Um papel em branco, um caderno, ou apenas uma folha. Um movimento. O nosso movimento. O que fazemos com ele, e o que ele nos leva a pensar, a sentir.
Devoção de Patti Smith começa assim. A minha cabeça começa a estalar com estas realidades.  
Devoção é o coração feminino.

"Porque escrevemos? Irrompe um coro. Porque não podemos somente viver."

É um livro dentro de outro livro.
O processo criativo da autora para o conto "Devoção".
A primeira parte do livro é como um diário da autora em que ela explica os seus movimentos e como do nada ou do tudo, saiu uma história que foi escrita freneticamente numa viagem de comboio entre dois pontos.
" A inspiração é um mistério recorrente e invisível, a musa que ataca quando menos se espera."
É assim que Patti começa este livro. O conto em si, não é o melhor que o livro tem, apesar da personagem principal ser de extrema beleza. Como em tão pouco está tudo lá. A minha descrença em relação ao conto vai para o ato da personagem que me pareceu sem qualquer sentido.
Mas foi o seu diário de bordo que eu prendi a minha atenção.
Como se movimenta, como se cria.
Serão todos diferentes, acredito. Patti Smith não tem um hábito, uma rotina.
Ela espera e desfruta e escreve o que vê e sente. A inspiração como ela diz é uma musa que a ataca quando ela menos espera.
Pelo seu conceito original, pelo menos por aquilo que me tem passado pelas mãos, e eu só posso responder por aquilo que li, é um pequeno livro inspirador.
Que posso dizer? Gostei! Vale a pena ler. 

"Por que razão nos sentimos impelidos a escrever?
Para procurarmos o isolamento no interior de um casulo nosso, absorvidos numa solidão que é alheia às necessidades dos outros. Virginia Woolf trabalhava num quarto só seu. Proust, por trás de janelas sempre cerradas. Marguerite Duras, numa casa habitada pelo silêncio. Dylan Thomas, na sua cabana modesta.
Todos em busca de um vazio para preencher com palavras. Palavras que irão penetrar território virgem, inventar combinações entre si jamais imaginadas, estender as suas possibilidades infinitas.
Há um grande número de cadernos em que os escritores falam de esforços falhados, de euforias ocas, de um caminhar feito incessantemente de avanços e recuos. É imperioso escrever, mas é também impossível não ficar envolto numa infinidade de batalhas, como se estivéssemos a domar um potro teimoso. É imperioso escrever, mas não sem um esforço persistente e um certo sacrifício: para abrir direções no futuro, para revisitar a infância e para equilibrar os terríveis e tortuosos meandros da imaginação numa linguagem que desperte a inteligência dos melhores leitores." 


22 de setembro de 2021

 


UM QUARTO SÓ MEU 




Mãe! Não sei como foi contigo. 
A minha Princesa disse mãe pela primeira vez. 
Eu estava tão distraída que aquilo apanhou-me de surpresa. Ela não repetiu. Eu bem tentei, mas apenas se riu e passou com a sua mão pelo meu rosto. 
Estava cheia de sono e ia ao meu colo. Adormeceu logo a seguir. Mãe. 
É dificil encontrar maior felicidade do que esta. 
Vou ter tantas saudades quando ela deixar de caber no meu colo. Quando ela ganhar asas e voar. Quando ela fugir do meu manto e do meu abrigo. Eu sei que é assim, mas eu queria que isso estivesse tão longe. 
Queria que o tempo parasse no exato momento em que ela descansa ao meu colo, no exato momento em que ela sorri para mim e faz caretas de satisfação, no exato momento em que ela espalha o comer pela mesa como se fosse uma brincadeira, no exato momento em que chapinha na água do banho e choraminga porque não quer sair de lá. 
Mãe, diz-me! Foi assim contigo? Diz-me que isto nunca vai passar e que seja em que altura for eu vou gostar dela e amá-la da mesma maneira e com a mesma intensidade. 
Se eu morresse hoje, mãe, eu morreria feliz.

20 de setembro de 2021

 


UM QUARTO SÓ SEU - VIRGINIA WOOLF



Algo de estranho aconteceu com este livro.
Já cirandava à volta da Virginia Woolf há algum tempo, mas a coragem fugia-me sempre no último momento.
Nunca li nada dela e hoje tenho aquele ar de arrependimento.
Um quarto só seu, não é um romance mas um belíssimo ensaio sobre a condição das mulheres na literatura ao longo dos séculos.
A sua prosa é melódica e dei por mim a sublinhar o livro em inúmeras passagens e a enchê-lo de Post'in de marcação.
A minha admiração pelo livro ficou bem marcada.

É um livro que terá de ser relido inúmeras vezes pela maneira como esvazia o nosso entendimento.
Essencialmente Virginia Woolf fala na importância das escritoras femininas e da sua evolução ao longo dos séculos.
É interessante dar-me conta de como demoramos séculos a passar de uma inexistência literária para aquilo que elas representam hoje dentro do mundo literário. Virginia Woolf leva-nos por esses caminhos do entendimento de uma maneira tão luxuosa que é difícil não entranhar na pele dessa realidade.
Algures por ali existe a seguinte frase "dentro de um século... as mulheres terão deixado de ser o sexo protegido."
Voltei atrás e procurei na biografia a data da edição deste livro (1929).
Estamos a delinear esse século e apesar de termos progredido como nenhum outro, ainda não deixamos de todo de ser o sexo protegido.
As suas conclusões são simples e tremendamente realistas. A mulher não tem as mesma condições que o homem. Não parte na linha de partida ao mesmo nível. 
Comparando, digamos que já conseguimos começar a correr ao mesmo tempo, mas o cantil da água dele está confortavelmente mais cheio e os seus sapatos tem melhor rasto.
Sempre foram bem alimentados e acarinhados e isso permite-lhes criar algo mais integro.

"As mulheres têm servido ao longo de todos estes séculos como espelhos que possuem a magia e o delicioso poder de refletirem a figura do homem com o dobro do seu tamanho natural."
Somos o seu contraponto, ele olha e pode continuar a afirmar "a melhor mulher era intelectualmente inferior ao pior homem."
Este tipo de mutilações foram geradas, alimentadas e enfatizadas durante séculos relegando a mulher para o papel de gerar filhos, cria-los e alimenta-los. 
O curioso é que sempre se escreveu sobre mulheres. Aparentemente somos o animal mais discutido do Universo.
"Na imaginação, tem a mais alta importância; na prática, é completamente insignificante. É omnipresente na poesia de uma ponta à outra; está praticamente ausente na história. Domina a vida dos reis e conquistadores na ficção; de facto, era a escrava de qualquer rapaz cujos pais lhe pusessem à força uma aliança no dedo. Algumas das palavras mais inspiradoras, alguns dos pensamentos mais profundos da literatura caem nos lábios dela; na vida real, praticamente não sabia ler, mal conseguia soletrar e era propriedade do marido."

Por isso e por muitas outras coisas, a falta de rendimento próprio, a falta de um quarto só seu; "As mulheres nunca têm uma meia hora... que possam chamar sua." o caminho da mulher na ficção é feito de tentativas e erro, de interrupções (acabei de ser interrompida!), de falta de espaço, de falta de estímulo.
E o desejo de nos ocultarmos ainda nos possuí! Certo?!
"O anonimato corre-lhe no sangue." Na maioria das vezes sim.

Muito há a dizer sobre este livro. Este pequeno livro que a Penguim House incluiu na sua coleção de Penguim Clássicos.
Este livro que pretende destapar o véu da igualdade ou a falta dela. Essa luta tão antiga quanto justa.
A mulher tem levado essa luta de forma paulatina.
A glória é um conjunto de caminhos, não o caminho em si.
Virginia Woolf termina de maneira soberba a insistir na necessidade de não nos perdermos nesse mesmo caminho da igualdade e arrisco-me também a dizer da integridade.
 "e se cada uma de nós tiver quinhentas livras por ano e um quarto só seu; se tivermos o hábito da liberdade e a coragem de escrever exatamente o que pensamos; se escapar-mos um pouco da sala de estar comum e se virmos os seres humanos não apenas nas suas relações com os outros mas em relação com a realidade; e o céu, também, e as árvores ou o que quer que seja em si mesmos; se encararmos o facto, pois é um facto, de que não há um braço que nos ampare, mas que caminhamos sozinhas e que a nossa relação é com o mundo da realidade e não apenas com o mundo dos homens e das mulheres."

As últimas linhas deste ensaio é um tributo e incentivo ao esforço e ao trabalho de quem corre na estrada em condições diferentes, mas mesmo assim corre.
E o contributo individual não é mais do que o vestido que colocamos no nosso corpo, pois as poetas não morrem.
"Mil canetas estão prontas a sugerir o que deverão fazer e o efeito que vão ter."
Por isso preparem as canetas, escolham os cadernos, ou até porque estamos numa era mais moderna e luxuosa, abram uma folha de texto, coloquem uma aplicação de notas no vosso telemóvel e escrevam. Pela igualdade!


16 de setembro de 2021

 



UMA PAIXÃO SIMPLES - ANNIE ERNAUX



"Não quero explicar a minha paixão, quero simplesmente, expô-la."

Mentalmente é deveras intrigante este pequeno livro. 
Os lamentos de uma mulher mais velha, sobre o seu amor por um homem mais novo que é apenas o seu amante.
Digo amor dela, porque da parte dele não existe nenhuma indicação que também assim seja.
E de repente temos setenta pequenas páginas em que uma mulher culta, independente e já mulherzinha (com filhos adultos), assume a sua vulnerabilidade a um mundo já limitado a entender a vulnerabilidade.

Profundamente honesto, na maneira como a escritora em estilo biográfico ou não, se expõe à fragilidade dos sentimentos.
Provavelmente terá sido olhado com um misto de pena e desprezo.
Como diz a própria, é uma espécie de dádiva invertida.
Admitir, escrever as várias transformações vividas à conta de uma paixão carnal, como se o próprio sentimento fosse fútil sem o ser.
Existe um prolongar daquelas sensações para além do durável. Um prolongar que o texto deu corpo e até algum sentido.
Não sei se o viveu ou se o imaginou na maior parte das vezes. Senti por esta mulher não uma vergonha, pela condição diferente daquela que se espera hoje das mulheres, mas mais do que isso, da sua capacidade de fazer daquilo que não existe, uma história de amor da sua parte. 
Uma entrega "sem limites às sensações e às histórias imaginárias da minha paixão", como diz a própria.

O tempo é o maior aliado da razão.
"Graças a ele, aproximei-me do limite que me separa da alteridade, a ponto de imaginar, por vezes, ter passado para o outro lado.
Medi o tempo de outra maneira, com o corpo todo. Descobri do que somos capazes, ou seja, de tudo. Desejos sublimes ou mortais, ausência de dignidade, crenças e comportamentos que achava insensatos nos outros porque nunca me tinha acontecido recorrer a eles. Sem querer, ele ligou-me mais ao mundo."
Por vezes temos de o viver para o compreender.
Para uma mulher é um misto de emoções, nem sempre fáceis de suportar ou admitir ou até de assistir, mas é acima de tudo um livro profundamente honesto. 

"Quando eu era criança, para mim o luxo era casacos de pele, vestidos compridos e vivendas à beira-mar. Mais tarde, pensei que fosse ter uma vida de intelectual. Agora parece-me também que é poder viver uma paixão por um homem ou por uma mulher."
E para vós o que é um luxo? 


14 de setembro de 2021

 



O QUE DIZER DAS FLORES - MARIA ISAAC


"Cada virtude está no equilíbrio entre dois defeitos. É fácil enganarmo-nos nas medidas do que somos; um bocadinho a mais de um ou a menos de outro...e estamos em grandes sarilhos."


É uma ligeira continuação do primeiro livro da escritora Maria Isaac. Bem que me avisaram para ler primeiro "Onde Cantam os Grilos". Estão interligados, não diretamente, mas estão. Gosto bastante desta abordagem perante a história.

Digo breve porque puxa a história mais para a frente, desloca-a ligeiramente de lugar e acrescenta-lhe novas personagens, mantendo as essenciais da história anterior.

Gosto muito deste conceito e acredito que não ficaremos por aqui. Existe sempre espaço para mais uma história, mesmo que se mude, apenas e só ligeiramente o enredo.
Por isso, peço-vos, por favor, façam como eu e sejam bons meninos. Leiam os livros seguidos. Primeiro "Onde Cantam os Grilos", depois "O Que Dizer das Flores".

Quando li "Onde Cantam os Grilos", em Julho considerei uma das minhas leituras preferidas do ano.
Não gostaria de ficar pela comparação porque se o tiver de fazer considero o primeiro livro com uma história mais consistente e mais atrativa.
Contudo e apesar de tudo, a Maria Isaac continua a suscitar o meu apreço pela sua escrita e pelas suas histórias. Continuamos presos à terra e às gentes de modos simples. A personagens cativantes e humanas. A filhos sem pais, a homens sem amor e a mulheres lutadoras e sonhadoras. 
Estas personagens femininas são verdadeiras personagens. Cativam, magoam, encheram o meu coração com a sua ternura e as suas ilusões e os seus sonhos desfeitos e refeitos. Cheias de bom-senso e amor-próprio.

Catalina, essa miúda travessa e pura, Lídia, Celeste e Antónia, Rosa Duque e a enigmática Ana Vaz que consegue atravessar mais um livro sem se dar a conhecer.
Ainda haverá espaço certamente para um livro sobre ela.
Lena, a adolescente sombria e aparentemente vazia, cheia de sonhos como todas as outras. Como todos nós. Matilde, a nossa conhecida Matilde sem escrúpulos que segue sempre o seu próprio caminho. 

Homens maus, homens injustiçados ou nem tanto e segredos por desvendar. Há sempre um bom segredo nas histórias da Maria Isaac.
A descoberta surpreendente do narrador.

É um livro pequeno mas deu-me a volta. Descobri e aceitei que com a Maria Isaac tenho de ler devagar. É isso que a sua escrita espera de nós, suavidade e tempo. Tudo tragado em pequenos goles.

O que virá a seguir? Temos espaço para tanta coisa!

P.S - Legendei a foto do livro com um breve trecho do livro. O mesmo fala de virtudes e defeitos. Da linha que nos separa entre os sarilhos bons e os sarilhos maus. Mas o que são virtudes e o que são defeitos. Uma bela questão? Alguém me ajuda nesta procura?
     

10 de setembro de 2021

 


A BREVE HISTÓRIA DA MENINA ETERNA - RUTE SIMÕES RIBEIRO






Uah!!! Este ficou dificil.
Pela primeira vez tenho uma certa dificuldade em colocar as palavras no sítio certo em relação à minha opinião sobre este livro.
Mágico, simples, sereno e belo. 
Tudo o mais que se possa dizer não passará de pura conversa.

Como não faço uma resenha tão limitada, vou expandir as minhas palavras.
Comprei o livro através de uma Livraria Independente e isso deixou-me bastante curiosa. Existem outros mundos para além do meu pequenino mundo e tomar consciência disso, acreditem é de uma extrema riqueza.
Por vezes pergunto-me o que é que eu faço aqui, neste lugar onde estou!

Conheci a escritora em resenhas no Instagram. Todas positivas. Todas surpreendentemente positivas e isso, ao longo do tempo foi despertando a minha curiosidade.
Estive tentada em adquirir a versão Kindle, mas não tenho plataforma e a minha reticência ao livro não físico ainda é bastante marcada. Tenderá a diluir-se com a realidade, mas por enquanto e na opção prefiro sempre a versão em papel.
Numa publicação da Rute Simões percebi onde encontrá-los e depois disto foi só escolher o primeiro.
"Breve História da Menina Eterna", chegou pelo correio e ultrapassou tudo o que está na fila para ler.

Capa bonita, livro de tamanho mais pequeno. As folhas da capa são de um veludo e dá gosto passar com as mãos. As cores são vivas e as folhas de dentro de qualidade. Nota-se um cuidado pelo todo. Pela matéria e pelas palavras.

Li-o em dois trago zinhos breves. Está cheio de marcações e marcadores verdes a condizer com a capa.
A história é trágica sem o ser. Bastante honesta e contada de forma poética.
O que é a morte no nosso caminho. Qual o reverso da vida. A inocência de M, perante uma realidade avassaladora.
É um exercício de raciocínio.
"Como se vive na vertigem de uma morte?
Fazemos de conta" 
Sim! Fazemos de conta como se a vida se pudesse perpetuar para além de uma morte eminente desde o momento em que temos vida.
É também um raciocínio da maternidade em si. O prolongamento em vida do que somos como existência curta e muitas vezes sem sentido.
"Deixar-te não é uma possibilidade, pois seguirei em ti."

É um livro de reflexão, cálido e profundo. Gostei muito. Gostei mesmo muito!

  

8 de setembro de 2021

 


O CARDEAL - NUNO NEPOMUCENO 



Com este livro fecho a série do Professor Catalão.
Fecho no sentido figurado, pois acredito que o Nuno ainda irá escrever muito com estas personagens.
Mas agora, que fechei o que está publicado, vamos a contas sobre as minhas opiniões.

Quero fazer-vos aqui uma breve confidência e um breve aviso. Já o deveria ter feito à algum tempo.
Não sou entendida no meio literário, nem tão pouco tenho formação especifica sobre ele. O que faço para ganhar a jorna é até bastante diferente.
Aquilo que eu escrevo aqui é apenas a minha opinião pura e sem qualquer pretensão. A minha humilde opinião sem qualquer ciência e faço-o apenas como um exercício de escrita.

Com a série do Professor Catalão fiz batota. E quando digo batota, refiro-me a não os ter lido seguidos.
Comecei pela "A Morte do Papa" que adorei e no fim de o ler percebi que fazia parte de uma série e que eu tinha começado tudo ao contrário.
Redimi o meu erro e fui começar de princípio com "A Célula Adormecida" que gostei um pouco mais. Depois "Pecados Santos" que gostei ainda mais.
Por último "A Última Ceia", que gostei um pouco menos e agora "O Cardeal", que gostei ainda um pouco menos.
"Pecados Santos" é sem dúvida o livro que mais gosto desta série. É diabólico. 

Isto que estou a dizer é apenas uma base de comparação.
Classificando-os por ordem de "Gostos". Acho que é próprio! Faz parte de nós. Existe uma continuação e um rumo novo que é dado às personagens e acabamos por gostar mais deste e daquele do que daquele outro.

E porquê esta minha avaliação no "O Cardeal"? Gostar menos do que os outros todos. Não estou a dizer que não gostei, estou a dizer que gostei menos.
Porquê?
A história não traz nada de novo e repete o Cliché do Vaticano. 
As personagens Professor Catalão e Diana pouco se mexem. Aliás, considero até que a Diana tem perdido protagonismo a cada livro. Até a sua essência está meio perdida.
A forma como escapou a um atentado que não lhe dizia respeito, mas que a apanhou no meio é até embaraçosa.

O que quero dizer com isto?
Por favor, Nuno Nepomuceno, dá um pouco mais de protagonismo à Diana. Coloca-a em perigo a sério mas dá-lhe um final feliz e mais realizado.
Ela é uma personagem muito inteligente, merece mais.
De resto a surpresa está lá, a reviravolta também. Não deixa de ser um triller empolgante do Nuno Nepomuceno que se lê de uma golpada e sem pecado.
Este tem um gosto especial. Foi autografado pelo autor na Feira do Livro de Lisboa.


7 de setembro de 2021

 


EXERCÍCIOS DE ESCRITA


"Escreva até ao fim. Não importa o que aconteça" Akira Kurosawa



Imagina que aquilo que eu quero dizer é triste e doloroso.

Imagina que a linha ténue da minha realidade se expande e encurta de forma grosseira.

Imagina que o lobo mau saiu das páginas do seu livro e devorou a minha estante de livros.

Faz de conta que eu estou apaixonada por essa linha e que quero falar dela aqui como uma confissão irreal e bonita.

Admite que queres falar comigo, mesmo que a linha me prenda e eu não consiga sair dessa irrealidade. Não tenho grande conversa para manter contigo.

Era só uma brincadeira, tic-tec, tic-tac…

Supõem que é para escrever até ao fim, não importa o que aconteça. Não importa onde vamos parar.

Eu admito que não tenho a mais vaga ideia onde a linha termina.

Já não sei se puxo os fios das minhas personagens ou se elas já vivem por elas.

Cisma que eu queira falar disso, e que essa conversa deixará um gosto amargo na boca. Cismas bem! Queria muito falar disso.

É que isto de repente ficou mais sério!

 



3 de setembro de 2021

 



CANTINHO DA POESIA

Pedro Tamen





Guardarás numa caixinha

o que não fiz por ti,

a mão que não chegou à sobrancelha

que nem aflorou,

o beijo repetido nas palavras

sem que o tacto

o multiplicasse qual se desejava.

Nessa caixa de nada não tardará depois

a não estares só tu,

a não estar só eu,

a estarmos só os dois.



2 de setembro de 2021

 


PROCURA-ME QUANDO A GUERRA ACABAR - AMY HARMON




Em Abril li o meu primeiro livro de Amy Harmon. "O que Sabe o Vento".
Quem segue o Blogue recorda-se que fiz grande alarido do assunto. O livro foi visceral para mim.
Ficou-me nas entranhas e foi a porta para realidades que há muito eu procurava.
Não vou aqui falar-vos dessas realidades porque as mesmas são outros assuntos, que estando relacionadas com livros nada têm que ver com este Blogue.
Estou a divagar eu sei. Por vezes dá-me para isto, e perco-me em conversas que para mim tem sentido mas para vocês, que ainda estão aí desse lado, não faz qualquer sentido.
Com tanto estrago procurei outros títulos da autora e pasme-se, em Portugal só existe mais um título. Este mesmo que têm à vossa frente.
Se a TopSeller por acaso deslumbrar estas letrinhas que eu aqui debito, por favor, traduza mais livros da Amy Harmon. Podem ter a certeza, eu compro!

E aqui me têm! Quatro meses depois do primeiro livro, quatro meses depois de uma longa caminhada eu que eu me fiz finalmente um pouco de gente, ou pelo menos deslumbrei esse conceito, cá estou eu com este livro nas mãos.
Posso dizer que é a primeira vez que abro a porta ao tema que insere a Segunda Guerra Mundial como pano de fundo.
Confesso que sempre fugi de livros que retratassem essa época. Porquê?
O diabo andou à solta! A maldade pairou no mundo e sobre a Europa com mais violência do que em todas as outras. A degradação de um povo, como povo, como existência foi sempre algo que me fez recuar neste assunto. 
Sou católica por formação, cresci e aprendi a ser católica e a acreditar em Jesus Cristo. Tive liberdade para procurar o meu caminho e encontrar o meu próprio Jesus Cristo, da minha melhor maneira possível. Sem pressões, sem imposições, sem ameaças, sem castigos. Assim é Jesus. Se queremos aprender alguma coisa sobre o que ele é e representa eu aconselho o Sermão da Montanha. Mas eu só aconselho. Eu não tenho perspetivas nem certezas. Tenho a minha realidade, e a minha devoção.
Jesus Cristo era Judeu. 
Penso que muita gente não o saiba. Eu não o soube durante muito tempo, mas como já disse a minha educação religiosa foi feita há medida da minha vontade.
Os Judeus foram o povo que mais sofreu e foi dizimado por Hitler. Não eram puros, não eram limpos, tinham sangue nas suas mãos, mataram Jesus Cristo.
E assim se fez uma Guerra, e assim quase se destruiu um povo.
"A família é imortalidade. E Hitler destruiu não apenas ramos e raízes, mas árvores inteiras de famílias, florestas! Todos partiram. A Eva era a última Rosselli que restava, a última Adler."
Quem tem presente um pouco da história do Antigo Testamento, e eu confesso que apenas tenho um pouco, recorda a história do Êxodo. Um povo em constante movimento. Para eles o êxodo nunca acaba. Chegaram ao século XX e continuaram em movimento, sem pátria e em fuga. 
"Fomos incapazes de criar raízes. Por isso, as nossas raízes estão nas nossas tradições, nas nossas famílias. Nas nossas crianças."
Uma família não é mais do que uma família que se estende e glorifica, que cresce e personifica. Na cultura Judaica a família é um dos símbolos mais importantes.

Eva e Angelo.
Eva judia. Angelo católico e padre. Ele nasceu na América mas os seus avós são Italianos. Ele com onze anos é mandado para Itália para estudar para padre. A mãe morreu quando deu à luz a sua irmã. O pai encaminha-o para os avós e entrega a filha a uma tia desta. A dor torna um homem vulnerável e egoísta.
Angelo nasceu com uma deficiência. Uma das suas pernas não veio completamente formada e ele usa uma prótese.
Ele é uma criança desamparada e triste, profundamente saudoso da sua mãe. 
Para ele a mãe não lhe dava simplesmente amor, a mãe era o próprio amor em si.
Eva, dois anos mais nova vive na casa dos avós de Angelo com o seu pai Camillo. Ela é judia. Nascida em Itália, mas judia. Menina travessa, bonita, Eva, Eva! Judia. Meu Deus. Judia em 1938. 
"-Por que razão as pessoas nos odeiam tanto."
Ser-se judeu no tempo de Hitler, no fascismo, na cegueira de quem manda, é ser-se um corpo sem alma, uma cana ao vento movida pelo medo. É apenas uma alma ao vento.
Acho que vamos perder a essência da Eva. Que crueldade!
"É uma caraterística distintiva dos judeus. Preferimos morrer juntos a ser separados daqueles que amamos."
"-Eu sei que não me salvaria a mim mesmo se não te pudesse salvar também. Eles quiseram ficar com as famílias."

Esta mulher arrebatou-me a alma. Que personagem!
Eva é doce, é travessa e apaixonada, é uma mulher, e é judia e é rebelde e luta. Resiste.
Até onde temos força para aguentar as contrariedades impostas pelo homem? Até onde!
Quando Eva está no seu limite, ela só encontra uma solução. Lutar. Resistir!
Espero que ela consiga... espero que ela consiga!

Não tenho qualquer dificuldade em dizer que li as últimas páginas em lágrimas. Bem! Não propriamente as últimas páginas mas as últimas oitenta páginas. 
Desde que Eva foi descoberta como judia, no Quartel General Alemão em Roma onde trabalhava e roubava o ouro que os Alemães roubaram os judeus. O mesmo era enviado para a Igreja católica que o utilizava para ajudar judeus a esconderem-se.
Ela foi presa e Angelo também. Ela serviu de isco para apanhá-lo, mas nem um nem outro disseram onde estavam os outros judeus. Tiveram a oportunidade de salvarem-se a si próprios mas não quiseram. A resistência em Itália foi isso mesmo.
Oiçam a canção "Bella Ciao" que hoje é mundialmente conhecida devido a "La Casa de Papel".
Esta música é mais do que a banda sonora de uma série que fala de resistência, é a música de um povo que se sacrificou contra o mal.
Eva foi deportada e apesar de eu saber que não estava morta, eu senti um vazio da sua ausência, nas páginas que se seguiram. Acho que escrever bem é isso mesmo!
Sentirmos o que as personagens sentem. A sua dor e a sua alegria. O seu vazio e o seu desespero.

Amy Harmon dá um final feliz para estas personagens.
Acho que é apenas uma pequena homenagem a todos os que não conseguiram ter um final feliz na Segunda Guerra Mundial.

Eu fujo destes livros. Meu Deus! Como eu procuro estes livros.