30 de outubro de 2020

 

Eu Acredito - David Machado



" Eu acredito que há um macaco que sai todas as noites com uma borracha na mão para apagar a Lua, um bocadinho de cada vez, até não sobrar nada e não ser o céu preto."

"Eu acredito que os sonhos continuam a acontecer mesmo depois de eu acordar, só que eu não estou lá para os viver."

"Eu acredito que é possível mergulhar na palavra Água."

"Eu acredito que, quando ninguém está a ver, as arvores se espreguiçam."

"Eu acredito que a minha voz só deixará de se ouvir muito tempo depois de eu morrer."

"Eu acredito que os fantasmas acreditam que eu também sou um fantasma."

"Eu acredito que à noite, para adormecer, os carneiros contam pessoas."

Eu acredito... eu acredito...
David Machado nunca desilude nos seus livros infantis, e este "Eu Acredito" transporta-nos através dos nossos medos e nas realidades cristalinas das crianças pequenas.
Realidades de uma simplicidade comovente e avassaladora, como "Eu acredito que a palavra acredito é infinita."
Tão infinita, como a nossa capacidade de acreditar para viver.


29 de outubro de 2020

 

Eliete - A Vida Normal - Dulce Maria Cardoso



Comprei este livro na Feira do Livro no Palácio de Belém, em 2019. Olhando para trás, esse dia quente está muito distante e para mim foi uma festa. Já não ia a "Feiras de livros", sei lá! Tanto tempo que já nem recordava o sabor doce de uma festa do livro.
Em 2019 havia duas hipóteses, a Feira do Livro de Lisboa ou a Feira do Livro no Palácio de Belém. Fiquei pela de Belém, era mais pequena, por isso as probabilidades de eu me perder lá dentro eram menores.
Fomos a um Domingo, creio até que o último dia de Feira e a fila para entrar era enorme. O calor das duas horas da tarde era ensurdecedor e a "safa" foi a oferta de umas garrafinhas Luso fruta fresquinhas que nos deram logo na entrada.
Dos livros que comprei, Eliete de Dulce Maria Cardoso faz parte deles. O outro foi A Vida no Campo de Joel Neto que já falei aqui neste Blogue... comprei um terceiro (como veem fui bastante poupadinha!), foi um livro Ser Blogger de Carolina Afonso e Sandra Alvarez que foi o grande apoio para a criação deste Blogue.  

Voltando a Eliete, já há muito tempo que queria ler alguma coisa de Dulce Cardoso. Tinha lido boas criticas dos seus livros, nomeadamente de Retorno e quando saiu Eliete fiquei verdadeiramente interessada e a Feira do Livro foi a desculpa perfeita.

A história é sobre Eliete, e roda em torno da sua vida, da vida da sua mãe e da vida da sua avó. Eliete é sem dúvida a parte principal e todas as outras, tal como os filhos e o seu marido fazem parte dos ingredientes deste bolo. Bolo mesmo é a própria Eliete.
Tenho o livro bastante sublinhado e marcado. Descreve a condição de ser mulher e mãe de forma minuciosa. Senti-me por vezes espelhada em situações da minha própria infância e adolescência. Principalmente nas maneiras de pensar, de ver o mundo.
Dulce Cardoso é genial nesse sentido. A mulher é retratada de uma forma perfeita e comovente até. A forma como logo nas primeiras páginas descreve o início da transformação do corpo feminino remeteu-me para memórias esquecidas.
"Ambos sabíamos que o meu corpo tinha mudado e que me arrastava irremediavelmente na mudança. A mudança começara sem alarido com os dois montinhos de carne que se empinaram sobre o meu peito acanhado..."

O livro retrata ainda a difícil convivência entre as pessoas, e a incapacidade para o perdão, mesmo quando os estados emocionais estão tão longe do nosso horizonte.
Eliete atravessa as memórias da sua vida enquanto lida com uma avó que já não tem capacidade para viver sozinha, com uma mãe que não perdoa a sogra por situações do passado, por um casamento que se vai despedaçando e pela perda da sua suprema importância aos olhos das filhas.
"Enquanto as miúdas precisaram dos meus cuidados, dei-lhes sempre comida a horas e preparei as refeições tendo em conta que uma não gostava de iscas, ervilhas e coco, e que a outra não gostava de peixe cozido e pimento, não permiti que fossem para a escolha sem o banho tomado, ainda que isso, muitas vezes, implicasse birras extenuantes, mantive a casa limpa, garanti-lhes as horas de sono suficientes, estive atenta ás listas do Pai Natal, e aos medos de escuro e dos ladrões, inscrevia-as na natação, na música, no ioga e no canto, escangalhei os meus fins de semana para as levar às festas das amigas, cansei-me com elas nos saldos sem comprar nada para mim, mudei-me para o quarto delas sempre que me chamaram num febrão, diarreia ou pesadelo.
Ninguém podia acusar-me de eu não ter sido uma boa mãe no que dizia respeito aos aspetos práticos, tal como ninguém podia acusar-me de eu não ter esforçado para me manter próxima das miúdas quando elas deixaram de precisar dos meus cuidados." 

Eliete vagueia em desacerto com a vida, está naquela idade lá mais para a frente em que começamos a colocar em causa o que somos e os caminhos que tomamos. Eliete faz uma analise crua do que foi a sua vida e descobre que não tem muito de bom.
Esta perspetiva permite-lhe tomar outros caminhos e pôr em causa tudo o que viveu. O seu maior desconforto será descobrir-se irremediavelmente só.
Gostei muito de ler este livro. Gostei muito da forma de escrever de Dulce Cardoso e já lá vai mais de um ano e continuo pacientemente sentada à espera do segundo volume.
Acho que vou ler este livro outra vez!




28 de outubro de 2020

 


Lua Nova - Volume II - Stephenie Meyer



Como já devem ter percebido, agora, decidi ler esta saga.
Sei que já vou um pouco atrasada, mas qualquer altura é boa para ler um livro, melhor ainda depois da moda ter passado.
Somos muitas vezes, constantemente, invadidos pelas novidades editoriais, e eu, confesso, que me perco muito nesse deslumbre, mas de vez em quando consigo captar a minha atenção para aquilo que não é recente. Efetivamente até o consigo fazer com bastante frequência. O meu problema mesmo é a outro nível, nomeadamente financeiramente para manter o vício constante na compra de livros e o tempo que é escasso para uma leitura compulsiva.

Neste caso foi o lançamento do "Sol da Meia Noite". Quero muito ler esse livro, mas consegui controlar os meus instintos e refleti que primeiro deveria ler a saga e depois partia para a leitura do "Sol da Meia Noite".

Voltando ao livro propriamente dito, acho sinceramente que este livro é um livro necessário. Não evoluímos muito na história, aliás há até personagens que circulam nesta história sem fazerem grandes aparições como é o caso da Vampira Victoria que procura vingança pela morte do seu companheiro James.
Mas acredito que este livro é apenas a transição para a história que ainda falta contar e que o próximo livro espero, confirmará aquilo que estou a dizer, e daí este volume II ser primordial.

A escrita deste livro, a forma como a escritora colocou a história e as personagens tem para mim uma grande evolução em relação ao primeiro volume. Posso dizer que li este livro com mais entusiasmo e mais vontade do que li o primeiro. A narrativa até determinado ponto tornou-se surpreendente.
O fim da relação de Bella e Edward é perfeitamente compreensível e a forma com Bella viveu (sobreviveu) a essa rutura está tremendamente bem escrita. Considero, pois até um livro melhor do que o primeiro.
O refúgio de Bella no seu amigo Jacob, a dor e o sofrimento descritos por Bella, as suas atitudes e anseios surpreendentes. Não estávamos perante uma adolescente, mas perante uma pessoa madura em termos de sentimentos.

No entanto em Itália a história para mim, ficou meio sem sentido. Não há grande volta a dar se queremos uma continuação, e Itália é a base de tudo o que daqui para a frente podemos esperar. Mas acho que aquela reunião no submundo das ruas de uma cidade Italiana ficou um bocadinho sem sentido.
Considerei que a alteração do pensamento do Edward em relação a Bella, depois de a ter pura e simplesmente abandonado, sem pensar nas consequências, reflete uma personagem ainda muito imatura e egoísta.
Daquilo que leio sobre opiniões de quem leu a Saga, nomeadamente no Goodreads, existe uma maioria tendencial em ver Edward como um Deus e Bella como uma miúda irritante e lamechas.
A minha opinião, agora no fim da leitura deste Lua Nova, é precisamente contrária.
Bella é sem dúvida uma rapariga estranha que se depara com a eminente morte em cada passo que dá. Tropeça até nos seus próprios pés. Isso pode ser um pouco irritante ao longo do livro, mas Bella é sem dúvida a personagem mais completa e constante nos seus sentimentos e nas suas opções.
O facto de estarmos a lidar diretamente com os seus pensamentos ajuda-me muito a pensar assim.

E vocês gostaram da história?




27 de outubro de 2020

 

David Grossman 

 Entrevista Revista do Expresso de 17 de Outubro de 2020



É um dos grandes escritores vivos de Israel e acaba de lançar "A Vida Brinca Comigo", o seu 13º Romance e o primeiro a contar uma história real.

A prepósito do seu último livro " A Vida Brinca Comigo", o Expresso entrevistou via Skype o escritor a encurtar as distâncias entre Israel e Lisboa.
Este último livro de David Grossman é o primeiro livro baseado numa história real. Uma história que fala essencialmente no ódio que sentimos .
"Quem somos sem o ódio que sentimos?"
Esta é uma pergunta que em Portugal não faz grande sentido, mas em Israel já é diferente. Aliás, quem são os Israelitas e os Palestinos sem a existência de um inimigo? A paz caída em (desabito), falta de hábito.

O livro tem como tema principal a família. A família é pois uma instituição misteriosa. O poder supremo da humanidade, aquilo que se desmorona no fim de tudo já ter caído.
O próprio escritor refere "Escrevo muito sobre as famílias e penso honestamente que os momentos mais interessantes na história da espécie humana ocorreram não nos palácios ou nos parlamentos, não nos campos de batalha, mas nas cozinhas, nos quartos das crianças ou nos quartos de dormir. A estrutura das famílias constrói-se por camadas de sensibilidade, temos sempre a sensação de estarmos demasiado perto ou demasiado distantes do outro - é tão difícil não nos impormos, encontrar equilíbrio certo. Cada família tem os seus códigos, a sua linguagem, as suas palavras passe, as suas anedotas do passado, o seu olhar único e irrepetível.  E mesmo os que se rebelam contra a família, ao fazê-lo estão a aprová-la."




O livro retrata 3 gerações de mulheres da mesma família. Vera com 90 anos, a sua filha Nina com 56 e a neta Gulli, de 39.
Cada uma pertence a um tempo diferente e tem a sua própria identidade.
Apesar de "A Vida Brinca Comigo" ser um romance, baseia-se em factos reais da vida de Eva Panic Nahir.
Eva tornou-se amiga do escritor e contou-lhe a sua história.
David Grossman define Eva como a pessoa mais extrema que conheceu. Uma mulher dura nos seus ideais e conceções políticas, no entanto tão mole, patética, atenciosa e amável.
A entrevista é extensa a aborda outras questões para além do escritor, dos seus livros e este livro em particular.
Recordo que David Grossman já anteriormente tinha sido premiado em 2017 com o International Booker Prize pelo livro "Um Cavalo entra num bar"
Ao escritor posso afirmar pelo que li, que a família é o seu centro de entendimento, ele mesmo a define como "...um lugar mais revelante da nossa existência." Mas atenção, a sua definição tem a pretensão do lado bom da existência humana mas também têm a alegoria de um "campo de extermínio."

A entrevista resvala como não poderia deixar de ser, para questões políticas, para o conflito entre os povos de Israel e da Palestina. Para o ódio!
A opinião de David Grossman sobre este assunto é clara. Para mim uma opinião bastante relevante;
"Quem somos sem a Guerra contra os Palestinianos? Quem são eles sem lutarem contra nós? Quem somos individualmente, sem os nossos pontos rígidos, sem o ódio, sem a agressão? Talvez nos recusemos a abandoná-los, talvez não queiramos desistir deles porque deixaríamos de nos reconhecer a nós próprios."

Parece-me uma boa sugestão de leitura e a descoberta de David Grossman, e não me refiro exclusivamente a este último livro. Refiro-me a toda a sua obra.
Não poderia terminar sem referir a frase que mais me cativou na sua entrevista, a forma como o mesmo define escrever;
"Escrever é estar em chamas. Depois de três anos a dedicar a alma e o corpo a um livro, é como se ele estivesse vivo, e nessa altura o sentimento é de ardor, de paixão."

E opiniões? Alguém já leu este último livro de David Grossman? Ou outro livro de David Grossman?
Preciso das vossas opiniões!  


25 de outubro de 2020

 


Uma vida no nosso Planeta - David Attenborough


Já se encontra em pré-venda o livro de David Attenborough, "Uma Vida no nosso Planeta" e o mesmo livro deu origem a um documentário com o próprio David Attenborough como protagonista.

Acabei de ver o o documentário e posso dizer que é assombroso. 
David Attenborough com 93 anos mantém uma lucidez sobre o nosso Planeta avassaladora, e a mensagem que nos tenta transmitir é essa também avassaladora. 
Porém, infelizmente muitos de nós não a vai compreender.
David começa o documentário dentro da cidade de Chernobyl e faz, digamos, uma metáfora/parábola entre esse acontecimento com 30 anos e a evolução da vida humana e do nosso planeta.

Para além das imagens da Natureza que nos habituamos desde há muitos anos a ver nos seus documentários, deixa-nos uma mensagem clara que só quem não quiser entender, não entenderá.

Desde que David era jovem e já mostrava interesse pela Natureza até aos dias de hoje a população mundial duplicou e o espaço ocupado pela Vida Selvagem reduziu-se por metade. Existem habitat inteiros completamente destruídos, extensões de floresta húmida reduzidas a 40% 
O Planeta deixou de ser a casa de muitas espécies animais.
Se o homem não tiver capacidades para voltar atrás e reconstruir o que destruiu, o Planeta sobreviverá e irá restabelecer-se por si próprio.
O Planeta já o fez num passado longínquo aquando da extinção dos Dinossauros.
Se o homem não tiver Sabedoria e limitar-se a ser Inteligente não estará cá para ver.

É inacreditável como pessoas como David Attenborough não são ouvidas!
A ler! e já agora para quem tem Netflix a ver! Aproveitem e mostrem aos vosso filhos.





  



22 de outubro de 2020

 

Pátria - Fernando Aramburu



Ninguém ganha, todos perdem. É um livro sobre a perda.
Sobre o sentimento e sobre a realidade da perda.

Já tinha este livro à algum tempo na minha prateleira. Era sempre preterido pelo tamanho, pelas suas 717 páginas, pelo peso e pelo mau jeito que dava pegar.
Quando vi o trailer da série na HBO, disse para mim própria. Chega de desculpas! Chegou a hora de ler Pátria!

É como disse no inicio. Um livro sobre vidas perdidas. Vidas que ao longo dos anos limitam-se a perder.
As personagens são muitas, e a todas lhes é dado a devida importância. Temos acesso ao longo deste extenso livro a caminhar na vida de todas elas, e são inesquecíveis.
Temos a família de Taxto e Bottori, com os seus dois filhos. Taxto é patrão de uma empresa, mas um homem afável e simples. Amigo dos seus amigos. Amigo dos que não têm, ou tem pouco.
Os filhos de Taxto têm a oportunidade de seguir estudos e de se formarem, ele medicina, ela direito.
Depois temos a família de Mirien e Joxian com os seus três filhos tão diferentes, com sentimentos tão opostos, com fins tão distintos.

O escritor/autor dá espaço a todas estas personagens de uma forma soberbamente humana, e ao longo da história não há como gostar mais deste ou menos daquele.
Joxe Maxi, o terrorista Basco da ETA, filho de Mirien, consegue até arrancar-me algumas lágrimas na fase final do livro.

Acabei Pátria com um sentimento apátrida sobre a realidade humana.
Todas estas personagens deixaram-me um sabor demasiado amargo na boca. Vidas por viver, vidas suspensas desde o dia em que Taxto é morto num atentado terrorista da ETA.
Ideais, convicções que se tem a vida, e que nos destroem. Nenhum alcança a felicidade plena, nenhum aflora sequer a pretensão de ser feliz. O amargo da vida, da perda, do mal corroí todos.

A história atravessa 30 anos. 
Passa pela morte de Taxto num atentado terrorista da ETA. Um atentado cometido pela ETA ao seu próprio povo. Porque Taxto também era Basco.
Joxe Maxi é filho de Joxian, o grande amigo de Taxto, mas Joxe Maxi na sua fleuma de juventude deixa-se levar pelos ideais de um povo Basco livre e independente.
Deixa a família, deixa o seu País, entra na organização terrorista, comete crimes e ao fim de tantos anos preso não consegue encontrar uma razão valida para. 
É verdade que os anos, o peso da solidão, o tempo para pensar, a alegria dos outros, a vida dos outros que ele nunca prestou atenção, existe, está lá, e o caminho e as escolhas que fez eliminaram a sua possibilidade de ter tudo isso. Os seus atos e as suas opções moldaram a sua vida e infelizmente moldaram dramaticamente a vida dos que estavam ao seu redor.  

Depois temos uma Bittori, mulher de Taxto, que deixou de viver quando o marido morreu. Uma vida parada no tempo que faz visitas constantes ao cemitério para poder falar com o marido. A solidão tem destas coisas!
Bittori não só perdeu o marido como também perdeu o apreço e respeito dos seus vizinhos. 
A viver numa terra pequena de maioria etarra, o mais fácil foi virar-lhe as costas, deixarem de a cumprimentar, encher as paredes de insultos ao marido, isolá-los nas suas vontades, matá-los em vida.
Também temos o padre que apoia clandestinamente estas ações violentas e incita os jovens. 
Temos esses jovens que são levados pelos ideais nacionalistas, pelas promessas, pela coragem, mas alguns pelo medo, 
Amizades que se desfazem por cobardia, ou por falta de coragem.

Não consigo escolher um lado do caminho. Não creio que o autor nos queira fazer escolher um lado, mas quererá que entendêssemos os dois.
É fácil entender uma vitima. As vitimas. Mas neste livro nem as vitimas são retratadas como perfeitas e puras.
É mais difícil entender um terrorista, a sua mão fervorosa, mas é possível.
Acima de tudo é possível a paz, o amor e a compreensão. O Perdão! A Pátria!
"Avançaram em linha reta em direção uma a outra. E a numerosa gente que estava na praça apercebeu-se. As crianças, não. As crianças continuaram a correr e a dar gritos. Entre os adultos formou-se um rápido bichanar. Olha, Olha. Tão amigas que elas eram.
O encontro deu-se ao pé do coreto de música. Foi um abraço breve. As duas olharam-se por instantes nos olhos antes de se separarem. Disseram alguma coisa uma à outra? Não disseram nada."
Duas amigas profundas, aquelas que eram para ser freiras e desistiram, aquelas em quem os amigos eram amigos, aquelas em quem as filhas eram amigas. Aquelas em quem a ETA e o terrorismo separaram.
Aquelas que só o perdão da vida podia permitir um abraço, nem que seja breve.

Ao longo de 30 anos, as opiniões de cada um foram esbatendo-se e a distância permitiu o amadurecimento da razão.
Porque prisão, todos nós vivemos nela, um pouco daqui um pouco dali.
Algures na página 699, quase, quase no fim do livro o escritor descreve aquilo que eu esperava com o passar das páginas.
A capacidade de nos pormos no lugar do outro, e o quanto isso destrói as nossas convicções.
Joxe Maxi recebe uma carta da irmã com uma foto na prisão. A irmã, Arantxa, a mais completa das personagens, pelo menos a mais coerente em toda a história sofreu um AVC e ficou incapacitada . É a primeira vez que o irmão vê com os seus olhos o estado da sua irmã, e com a foto vem uma carta ditada por Arantxa;
"Tu tens a tua prisão, eu tenho a minha. A minha é o meu corpo. Calhou-me prisão perpétua. Tu um dia sairás da tua prisão. Não sabemos quando, mas sairás. Eu nunca sairei da minha. Há outra diferença entre ti e mim. Tu está aí pelo que fizeste. Em compensação, o que é que eu fiz para merecer a minha condenação?
Esta última frase, na realidade a passagem inteira, bateu forte em Joxe Maxi."
Arantxa não escreveu o que escreveu para criticar ou condenar o irmão, não o disse com rancor nem com raiva. Apenas limitou-se a expor uma realidade crua.
Quando falo nas personagens deste livro, tenho como referencia esta passagem e esta forma sóbria e completa de todas elas, umas mais outras menos é claro, mas sem exceção todas as personagens estão muito bem trabalhadas.
Se me perguntarem de quem gostei mais? Bom, não é fácil pela complexidade, mas Arantxa é concerteza uma delas
Miren é talvez a mais complexa, mais difícil de agradar. Mulher rezingona, de difícil trato, mas com capacidade para grandes rasgos. A maior defensora dos filhos. Na hora H, ela estava lá. Joxe Maxi, apoio-o, acompanhou-o sempre na prisão, nunca o abandonou. Arantxa, tomou conta dela quando sofreu o AVC, mesmo depois do marido e os filhos a deixarem, E ao mais novo, bom, a esse lá estava ela ao seu lado com este se casou com outro homem.

As nossas prisões, os nossos desenganos. É tão fácil fazer mal aos outros. Temos sempre desculpas, ideais, tantas outras coisas.
Desculpas, desculpas... falta de capacidade para nos amarmos.

Livro extraordinário. Recomendo, muito, muito, muito...
Muito humano acima de tudo. Fala das pessoas, tal qual como elas são, até quando são feias e más.



18 de outubro de 2020

 Ípsilon de sexta-feira, 16 de Outubro de 2020 (Salman Rushdie)




Quando oiço falar de Salman Rushdie, lembro-me invariavelmente dos "Versículos Satânicos". 
Nunca li o livro. Mas lembro-me de ter lido "O último suspiro do Mouro".
Não me lembro que idade tinha mas seguramente pouco mais de 20 anos, e o que recordo do livro é que não consegui parar de ler. Tive até comentários desagradáveis de alguns familiares em como estava a tornar-me bastante antissocial. Isto tudo porque passei as tardes de Domingo na esplanada da praia, e em vez de falar com os outros, metia a cara no livro. Acho que até passei por mal educada!
De lá para cá admito que nunca mais tive grande interesse na sua obra, e pelos vistos devo de andar bastante distraída, porque convenhamos, quem nos engole num livro também o deve fazer nos outros!
Uhhmmm! Lembrei-me agora! Li outro livro de Salman Rushdie, "Harum e o Mar de Histórias", o que vem reforçar a minha frase anterior. "Harum e o mar de Histórias" é uma das grandes preciosidades que tenho lá em casa. O escritor ainda não perdeu nenhum ponto.

Quando vi Quichotte nas bancas despertou-me a atenção. A mera referência ao nome e a inspiração ao original Dom Quixote, foi o suficiente para ficar de orelhas levantadas e olhar de vez em quando para a possibilidade de voltar a Salman Rushdie.
Dom Quixote de La Mancha faz parte das minhas fantasias. Nunca terminei de ler o livro. Acredito, porque peguei nele demasiado cedo não para a minha compreensão, porque   aquilo que li adorei, mas para a minha paciência, pois em casa dos meus pais existe uma edição de D. Quixote em capa dura, de tamanho A4 e dividido em 3 volumes. Quando se é demasiado nova não se tem paciência para tanto.

Na revista que contém a entrevista de Isabel Lucas ao escritor, o livro de Salman Rushdie é descrito da seguinte forma e passo a citar;
"Quichotte é inspirado no cavaleiro de Cervantes e transporta as marcas de uma época. [Viveu em tempos, numa série de residências temporárias ao longo dos Estados Unidos da América, um viajante de origem indiana, idade avançada e faculdades mentais declinantes, que, devido ao seu amor pelo televisão acéfala, passara uma exagerada porção da sua vida sob a luz amarela de sórdidos motéis a vê-la em excesso, e em resultado disso sofrera uma estranha forma de lesão cerebral.]. Ás primeira linhas Rushdie expõe a paródia negra sobre o presente num romance de olho nos recursos usados pelo escritor Castelhano e convocando heróis e ambientes de Ionesco ou da Guerra das Estrelas ou deixando entrar um grilo falante. É um jogo, e vale tudo menos perder o pé na realidade a que o real quer fugir. Se o cavaleiro Quixote arruinou a cabeça a ler romances de cavalaria, a ruína de Quichotte foram os reality-shows de tal moco que se apaixonou por uma celebridade e por ela atravessa a América. Esse périplo permite a Rushdie dissertar sobre a actualidade. Quando o seu velho Quichotte vai atrás de Salma R., a amada, no caminho sonha com um filho, como Geppetto sonhou com Pinóquio, ele aparece, chama-se Sancho, ganha vida e será a voz da razão que o pai não tem." 

Nesta entrevista que Salman Rushdie concede a Isabel Lucas, o escritor fala de tudo um pouco. Escritor de origem Indiana, vive actualmente nos Estados Unidos. A sua vida foi marcada por "Versículos Satânicos" e invariavelmente a conversa aborda esse tema.
São referidos também outros assuntos que fazem parte dos seus livros, como o amor, a realidade e a verdade.
Descobri outros títulos do autor que definitivamente deverão interessar-me: "Joseph Anton" e "Os filhos da Meia-Noite"
É um escritor que mostra claramente a sua capacidade de perceber a transformação da realidade no mundo e como isso afeta o meio envolvente. Quichotte é um exemplo disso, com uma clara conotação ao título de Cervantes transformado ou adaptado a uma realidade dos dias de hoje.

Achei bastante interessante a sua opinião sobre a América dos dias de hoje, nomeadamente no que toca a política, racismo e até sobre a grande expressão usada pelo atual Presidente "Make América Great Again" .
Políticas á parte, fala também da sua perceção sobre os instintos das pessoas, e garanto-vos que a sua resposta deixou-me bastante alarmada. 
Fala de uma reviravolta na forma de pensar no mundo. De um mundo virado ao contrário. Fala em como as gerações mais velhas e as gerações mais novas, trocaram de posições. Em como hoje os mais velhos têm opiniões mais liberais e abertas e como as gerações mais novas se tornaram mais conservadoras, são mais censuráveis e com atitudes mais puritanas em relação aos outros. Fala num retrocesso de mentalidades.
A entrevista acaba com a questão principal das nossas vidas. O amor. Afinal a única coisa que vale realmente a pena.
Quanto ao livro Quichotte chega amanhã pelo correio.
Assim que puder teremos opinião!


  


15 de outubro de 2020



 PASSATEMPO mês de Outubro!!




Com seis meses volvidos desde o inicio deste projeto, quero dar um mimo a quem me segue e a quem daqui para a frente me queira seguir. 
Como falamos de livros, nada como um passatempo com a oferta, não de um (1) livro mas de cinco (5) livros!!

O que é preciso para que te possas habilitar a ganhar um deles? Aqui vão as regras...

1 - Seguir-me no meu Blogue.
 (Quem já me segue no Blogue, também pode participar, basta que conclua também as fases seguintes.)

2 - Seguir-me no meu Instagram (livrista.blogspot), ou no Facebook (livrista). 
Na publicação que vou fazer nas redes sociais, colocarem nos comentários qual o livro que gostariam de ganhar e indicar 3 amigos que se também seguirem as regras ficam habilitados a ganhar.

3 - Comentarem até ao final do mês nesta publicação do Blogue o titulo de um livro que leram este ano e que gostaram muito. (Vamos fazer grandes leituras com estes comentários!)

Para ficarem habilitados têm que cumprir as 3 regras.

E que livros são?

1 - "No meu Peito não cabem Pássaros"  - Nuno Camarneiro - É um romance de estreia invulgar e fulgurante sobre as circunstâncias quase sempre dramáticas que influenciam o nascimento de um autor e a construção das suas personagens.

2 - "Os Templários" - Dan Jones - Quem eram realmente os templários? E o que lhes terá, de facto acontecido? Um livro imperdível, escrito com grande rigor sobre uma das épocas mais fascinantes e ao mesmo tempo mais dramáticas da história da Humanidade.

3 - "Educar com Mindfulness" - Mikaela Oven - Para uma adolescência sem dramas, sem conflitos destrutivos e com muita conexão!

4 - "Ensaio sobre a Cegueira" - José Saramago - O Ensaio sobre a Cegueira é um livro único na nossa história literária e também é preciso dizê-lo, um dos grandes romances que se escreveram no século XX.

5 - "Objetos Cortantes" - Gillian Flynn - Um drama psicológico sinistro mas extraordinário. Flynn tem um olho implacável para a imperfeição humana e para o mal que se move entre nós.



P.S - (Informações Relevantes) - Este passatempo ainda está a ser feito sem nenhum apoio das editoras. A escolha dos vencedores será feita de forma aleatória e o passatempo estará em vigor até ao dia 31 de Outubro.
Os vencedores serão divulgados no dia 1 de Novembro, neste mesmo Blogue e nas redes sociais mencionadas. 
As imagens usadas podem ter sido retiradas da internet, e as várias referencias aos livros indicados retiradas da Wook.pt


 Objetos Cortantes - Gillian Flynn



É um livro perverso e viciante. Mesmo viciante, e posso dizer mesmo, mas mesmo muito perverso.
Como é referido na capa, estamos perante uma história sobre a maldade humana. 
Sei que a maldade humana é muito difícil de definir. Já tenho idade suficiente para ter percebido que malícia é uma palavra muito relativa e que o mal e o bem são estados, não independentes, mas que andam de mãos dadas. 
Por palavras claras, todos nós temos um pouco de maldade e um pouco de bondade, e este livro no meu ver pretende retratar isso mesmo.
Não se enganem, seremos todos feitos de crueldade, resta saber se essa parte de nós se sobrepõem ou não!
Até podemos fazer um pequeno exercício íntimo. Quantas vezes num dia conseguimos praticar uma traquinice sobre os outros... e, também sobre nós próprios!

Estou a vaguear nos meus pensamentos, eu sei! Conversas para outras alturas!!

Comprei este livro por impulso, não sabia nada da autora, mas existem pelo menos mais dois livros que me interessam e que serão compras futuras. "Lugares Escuros" e "Em Parte Incerta"
Curiosamente todos eles já com adaptações ao cinema.
Objetos Cortantes começa como uma simples história de furo jornalístico sobre um caso de polícia.
Numa pequena cidade de Missouri, duas crianças são assassinadas de forma idêntica. Nada de muito relevante e até desinteressante para a opinião pública. Contudo existe um jornal em Chicago que vê nesta história uma oportunidade para subir as vendas e decide fazer a cobertura do caso e escala para a história a única pessoa que não poderia ter feito.
Camille, natural dessa mesma cidade, com problemas do foro psiquiátrico e com um passado de dor e sofrimento na casa onde nasceu e cresceu.
A história a partir de um determinado ponto torna-se viciante e muito difícil de parar de ler.
Cheguei a desconfiar do verdadeiro assassino no inicio da história, mas a autora de forma brilhante distraí-nos para outros caminhos e até esquecemos que foi a partir daí que partimos nas nossas desconfianças.

Camille é uma personagem arrebatadora... daquelas que nos dá vontade de colocar no colo e abraçar.
É o sofrimento vivo das relações humanas e a única pessoa dentro do seu circulo que vê o mal dentro de si e percebe as fases e os estados de sofrimento que infligiu aos outros. É contudo a personagem que mais sofreu e a quem foram impostos vários sofrimentos. A sua falta de capacidade para lidar consigo própria leva-a a situações extremas de infligir dor a si própria como se isso a pudesse de alguma forma  libertar de tudo o resto.
É esta mesma Camille que volta a Wind Gap para fazer a cobertura jornalística sobre o caso das meninas assassinadas e o que ela descobre e volta a reviver vai muito além da capacidade de um ser humano lidar com a loucura.
É uma vez mais arrebatada para essa angústia sem que possa, mesmo que tente fugir a ele, e descobre que o que existe há sua volta, dentro do seu seio familiar é um mal que pode estar dentro do seu próprio sangue. É a única que luta contra isso... aí está, a capacidade que cada um terá para sobrepor um estado ao outro.

Mais não posso contar. Estragaria o verdadeiro sentido do livro. 
Leiam com o espirito aberto e o estomago assente. Nem vão acreditar quem é o verdadeiro assassino! 

14 de outubro de 2020

 

O Livro do Desassossego - Fernando Pessoa 



"Tendo visto com que lucidez e coerência lógica certos delirantes sistematizados justificam, a si próprios e aos outros, as suas ideias delirantes, perdi para sempre a segura certeza da lucidez da minha lucidez." (135) - (1916?)




Será que ainda estamos lúcidos? Nok-Nok!!! Está aí alguém?

Em 1916, Fernando Pessoa na sua devastada lucidez, escrevia este pequeno paragrafo sobre a clareza de raciocínio ou a falta dela.
Mais de um século depois, todos os dias ou quase, eu pergunto-me, se serão os outros que têm ideias delirantes, ou se sou eu que já perdi o "fio da meada". 
Verdades que hoje são ditas com uma lucidez impressionante, amanhã não passam de relatividades que nos desfocam e a mim particularmente confunde-me.
Sou de compreensão lenta e por isso a mudança repentina de estados, ideias e certezas provoca-me enjoos e sei lá, tonturas delirantes de não saber o que ando aqui a fazer.
Oiço discursos na boca de certos iluminados que a comunicação social dá espaço e pergunto? Será que eles se ouvem a eles próprios ou fui eu que neste meio caminho, nesta peregrinação perdi a minha própria lucidez?
Tal como Fernando Pessoa o melhor é mesmo nem perguntar. Deixar aos entendidos das certezas da sua lucidez crescente a verdade das coisas e dos atos.
O melhor mesmo é acreditar que quem se perdeu por este caminho fui eu. E que bom!...
Devo ser eu que não percebo mesmo nada!



12 de outubro de 2020

 

Luz de Luz de Pedro Strecht



Este livro pequenino, não conta uma história, não é um romance, nem um conto infantil. Não se assemelha aos extraordinários livros de Pedro Strecht sobre o dia-a-dia e a sua profissão. 
Este pequeno livro é um ensaio, pequenas frases tiradas aqui e ali sobre a felicidade ou a falta dela e o buraco negro da depressão social. O vazio, o nosso vazio interior.

Frenesim? Como cada um de nós admite dentro do seu ser esta mesma palavra? E dor? Perda? Derrota? Diferença? Solidão? Vazio?
E o riso dos outros? É reconfortante e estimulante, ou o ruído degrada-nos ainda mais?
A minha opinião sobre este livro terá de ser uma opinião muda e aberta.
Cada paragrafo convida-nos a parar e refletir.
Na página 15, Pedro Strecht transcreve uma frase do artista chinês ai wei-wei que nos devia curvar a todos "a maior tragédia da sociedade atual é o desrespeito."
Muitas frases podem ser retiradas deste livro. Muito haverá a refletir sobre a luz e o escuro.
Essa reflecção não a quero partilhar convosco porque cada um tem a sua e todos temos luminosas ponderações e assombrosos desvaneios. Há quem fuja delas. Há quem queira viver sempre na luz e nunca toque na vida.

"pelo meio de um caos interior que encerra um dia excessivo e sem pausa, a quebra do tempo espreita com esforço e escrevo. penso, deixando que a mão siga o curso inexplicável e singular do feixe eléctrico que dá vida ao pensamento. a luz mantém-se acesa no meu interior e como chama de fogo aceso, não pára, delineia formas, brinca, transporta-me sem queixa de aqui para ali, em contínuo mas diverso movimento (lembra uma dança). dizem que tudo no mundo começou com um sim, o possível contacto entre dois que se aceitam e completam e que, assim, geram outro e outro momento. mas aceito com tranquilidade o não: a contrariedade, a ambivalência, a impossibilidade (ainda que transitória) desse mesmo encontro. quer dizer, respeito o eterno espaço por preencher, a não concordância da frase, do texto, do amor, do desejo, do sonho. sei que há a solidão e o escuro, a morte, mas nenhuma dessas palavras me prende ou bloqueia. nem tão pouco a ausência de luz, que não tardará em chegar (re)inventando novas sombras, um eterno contraste de definições/indefinições, ordem e caos. preocupa-me, isso sim, apenas o excessivo de um branco que cegue, a paralisia, a força retropulsora ou estagnante que continuamente evoca o medo de existir."

O que nos leva hoje em dia a ter tanto medo da diferença e ao mesmo tempo aceitar os extremos dos comportamentos com tanta facilidade?
O que nos leva a levantar bandeiras e a caminhar para a violência sobre ideais gastos e manipulados?
O que encontramos nas nossas vidas quando o Sol se põem que nos humilha e diminui que nos faça continuamente procurar a luz estéril no meio do escuro?
O que nos faz virar as costas ao sofrimento, dor e morte?
No entanto banalizamos a morte e a dor. Escondemos a nossa inépcia nas estatísticas.
Ultimamente, todos os dias vemos e ouvimos uma estatística de morte e já a aceitamos como a maior das banalidades, como se quem morresse deixasse de contar como pessoa e passasse a ser um mero número diariamente banalizado.

Escondemo-nos diariamente, atrás de uma fachada de luz, a invariável condição de não sabermos viver.
"existir é diferente de viver..." e existir é uma mera formalidade que praticamos na maioria dos nossos dias.
Será que nos damos conta? A maioria está desatenta ou encontra distrações. Os outros perecem ou definham!
Que estimulante fim de tarde!
  


11 de outubro de 2020

 Crepúsculo - Stephenie Meyer



Quando era adolescente não lia livros para adolescentes.
Sempre fui uma personalidade do contra, por isso, há 15 anos atrás quando foi editado em Portugal "Crepúsculo", não lhe liguei nenhuma importância. 
Vendo bem as coisas, há 15 anos atrás eu já nem sequer era adolescente, e definitivamente a minha vida não passava por aqui. 
Curioso! Agora que faço uma pesquisa sobre o assunto, descubro que a minha relação com esta história só poderia ter sido cinematográfica, e aí ficou tudo perdido pela minha leve irritação pela Kristen Stewart. 
Só vi o último filme "Amanhecer". 
Reconheço que gostei bastante, e até reconheço que perdi a leve irritação pela atriz Kristen Stewart.
Peguei agora em "Crepúsculo", sabendo que estou a ler literatura para jovem adulto, categoria onde eu já não me enquadro, mas não resisto a fazer mais um diário de bordo sobre este livro sobre Vampiros e Lobos;

1º Dia;
Cheguei até à página 91 sem nada de novo. Uma menina de dezassete anos que se muda para a cidade do pai, e começa a escola. Assistimos a um momento de sofrimento que muitas vezes não captamos nos outros seres humanos que circulam à nossa volta. Sejam novos ou velhos, temos a relativa capacidade de esconder os nossos sentimentos, e temos tendência a julgar que os jovens de adaptam muito bem ás circunstâncias da vida e que os velhos não tem grandes ambições.
Tudo o que é extremamente diferente no nosso dia-a-dia é doloroso. É tão difícil entrar pela primeira vez numa creche, como numa escola nova como num lar. Não acham?
Então porque fazemos parecer aos outros que lá entram que é perfeitamente normal?
Bella Swan é a primeira protagonista da história e é a menina de dezassete anos que se muda para a terra chuvosa e triste do pai, para que a mãe possa ser feliz.
A vida é tramada, e ás vezes até os mais novos sabem fazer sacrifícios. Ás vezes até mais que os outros!
Bella até é bem recebida na nova escola, comparando com um grupo que há muito tempo é colocado de lado.
Edward é um deles. Mas é para Edward que Bella não consegue parar de olhar.


2º Dia;
Ok, definitivamente estamos perante um livro sobre a adolescência. Não um livro para adolescentes.
O ambiente é completamente estudantil. Existem os amores e os desamores que fazem parte do Universo daquela idade.
A luta pela atenção do outro própria de temperamentos jovens.
O sentimento de inveja e até de insegurança perante situações corriqueiras do dia-a-dia.
Não quero aqui dizer que estes sentimentos são próprios e exclusivos da adolescência, mas a forma como os vivem e interpretam é garantidamente diferente dos outros.
Depois temos a Bella, o estereotipo da adolescente que não se enquadra nessas realidades. Uma menina solitária por natureza. Que se dá e que convive com os outros, que até é desejada pela maior parte deles, mas que tem uma perceção diferente. Talvez, mais amadurecida. Essa sua capacidade vem associada á sua falta de jeito até pelo equilíbrio e pela forma como os sarilhos a acompanham.
Depois temos Edward que é definitivamente um vampiro. Um ser sobrenatural!
Depois temos os dois!


3ºDia;
Se nós os humanos conseguíssemos amar com tanta candura e tanto enlevo o outro, acredito, o nosso mundo seria definitivamente mais pacifico.
Edward e Bella descobrem-se de uma forma profundamente inocente e revelam-se um ao outro.
Se todos nós nos conseguíssemos amar sem subterfúgios a nossa vida seria sem dúvida muito mais despretensiosa e verdadeira.
Mas a história não pode ficar por aqui e o perigo parece espreitar. Se eu fosse adolescente queria ser Bella. Queria não ter medo do perigo. Queria encara-lo de frente. 
Bem! medo, medo todos nós temos e Bella também o têm, mas não deixa que isso lhe tolde o pensamento ou as atitudes.
Sinceramente não sei se a atitude dela, é uma atitude de falta de maturidade ou muito pelo contrário é uma atitude bastante amadurecida. Bella apresenta uma personalidade bastante adulta que se resigna, ou que não tem medo do seu destino.
Bella não compreende sequer o alcance do seu destino, apenas sabe que aconteça o que acontecer não pode fugir dele.
"Ser mulher implica muita coisa. É comovente."

4º Dia;
E de repente, os vampiros perseguem-se uns aos outros. Bella transformou-se numa presa como qualquer animal indefeso, e aos outros resta tentar protegê-la.
A realidade é deveras impactante. Creio que Bella com tanta informação, não consegue assimilar o tamanho de toda esta realidade. Como sempre faz asneira. Não basta ser desajeitada e ter falta e equilíbrio. Têm tendência em colocar-se em sarilhos e a fazer asneiras.
E agora o predador apanhou-a!

5º Dia;
Gostei mais do livro do que inicialmente julguei que iria gostar. No fim, por enquanto tudo acaba bem, mas fica tudo em aberto para os próximos livros.
As opiniões que li sobre o livro são todas elas bastante contraditórias. Ou se gosta, ou não se gosta mesmo nada. E eu posso dizer que gostei.
A história é bem contada e tem nexo, a personagem Bella é bem construída e os diálogos entre Bella e Edward são bastante interessantes. Se a história tem lógica? Não. Mas não tem de ter.
É uma história sobre vampiros, e os vampiros não existem, por isso estamos a falar em fantasia onde tudo é permitido.
Bem! Sei que estou com alguns anos de atraso, mas vou ter de considerar os restantes volumes da saga na minha lista.  
  


6 de outubro de 2020


 A verdade sobre o Caso Harry Quebert - Joel Dicker



Tenho muitos livros com frases sublinhadas. Frases que me inspiram e que quero deixar marcadas para o futuro. Quando volto a pegar naquele livro, já sei o que verdadeiramente me cativou, está marcado!
No caso deste livro até coloquei marcadores autocolantes de livros para assinalar certas páginas. 
Quem pegar no livro na minha prateleira irá dizer que é um dos meus favoritos. Mas engana-se.

Já à algum tempo que ando para comprar um livro de Joel Dicker. Afinal toda a gente fala dele e o número de exemplares vendidos por cada livro tem zeros que nunca mais acaba.
Conclui a minha primeira escolha neste livro. A sinopse era interessante e prometia que seria uma leitura, daquelas viciantes que se engolem num fim de semana porque não se consegue largar o livro. 
Mas não foi bem assim! Foi mais ou menos!

Não me interpretem mal, considero o livro muito bem escrito e a história está muito bem trabalhada. Aquilo que é agora, mais à frente deixa de ser. Nas mais de 600 páginas todas as personagens foram em algum ponto passíveis de suspeita. E isso, que é estimulador, para mim, tronou-se demasiado cansativo.
Houve uma altura em que suspeitei do próprio Harry Quebert.
Mas é sem dúvida uma história absorvente e apesar de não ter lido o livro de uma forma tão fulgurante (pois as primeiras 200 páginas são um pouco desestimulastes), como pensava, posso dizer que tive uma leitura compulsiva nos últimos dois dias.
Não nos limitamos a um triller, mas também a uma história de amor proibida entre um escritor, homem feito e uma garota de 15 anos.
Descobrimos até várias histórias de amor em torno daquela menina de 15 anos. Nola.

Cheguei ao fim do livro sem conseguir ter um sentimento de empatia com a personagem Nola, e acho que a minha pequena desilusão com o livro chama-se Nola.
Não consegui compreender Nola, nem nos seus atos, nem nos seus sentimentos, e apenas no fim quando me foi revelado a principal causa da sua morte tive um leve carinho por ela.
Nola deveria ser uma personagem completa e inesquecível, mas na minha opinião é retratada sempre de uma forma superficial e aquilo que Nola acreditava, pensava, sentia ficou por contar neste livro. Assumo até como defeito meu, mas não consegui alcançar Nola.

Não retiro o valor nem a brilhante história contada por Joel Dicker. É sem dúvida um triller denso, daqueles difíceis de interpretar e de levar a cabo até ao fim. Com muitas suspeitas e muitas reviravoltas. As minhas suspeitas tiveram sempre erradas. Apenas nunca me enganei numa coisa, nunca acreditei na culpa de Caleb.

Quero ler mais livros de Joel Dicker, sem dúvida. Não nos facilita a vida e isso é bom, muito bom. A minha única frustração chama-se Nola. Só consegui gostar dela pelos olhos dos outros.

E depois existem as 31 lições de Harry Quebert;

28.
"A vida é uma longa queda, Marcus. O mais importante é saber cair."

25
"A liberdade  é uma luta permanente da qual temos pouca consciência. Nunca me resignarei."

21
"-Marcus, sabe qual é o único meio de avaliar o quanto ama uma pessoa?
-Não.
- É perdê-la."

12
"Aprenda a apreciar as derrotas, Marcus, pois são elas que o edificarão. São as derrotas que conferem todo o sabor ás vitórias."

7
"Alimente o amor, Marcus. Faça dele a sua mais bela conquista, a sua única ambição."

4
"- Quando chegar ao fim do livro, Marcus ofereça ao leitor um facto inesperado.
-Porquê?
-Porquê? Porque temos de manter o leitor em suspenso até ao fim. É como quando joga às cartas: deve guardar alguns trunfos para o fim."

1
"O último capitulo de um livro, Marcus, deve ser sempre o mais extraordinário."