PLANÍCIE DE ESPELHOS - GABRIEL MAGALHÃES
"Sabes, Marta, quando alguém morre, durante um dia e uma noite vagueia pelo mundo a resolver as coisas que não ficaram resolvidas porque, quando morremos, muitas vezes não tivemos tempo de arrumar a gaveta da vida que vivemos."
Há alguns anos atrás pedi á minha irmã como prenda de Natal o livro de Gabriel Magalhães, "Espelho Meu". Foi um dos melhores livros que li.
E na volta comprei este "Planícies de Espelhos", que ficou esquecido na estante.
São aquelas coisas que lá temos, ás vezes em maior número, outras vezes levam um desbaste.
É um defeito de quem vai adquirindo com mais velocidade do que vai conseguindo ler, e muitas das vezes outros títulos vão-se sobrepondo a tudo o que temos na estante.
Por vezes também é falta de olhar para ela com olhos de ver.
Veio agora parar à minha mão e posso dizer que a leitura não sendo uma história surpreendente tem a sua graça.
Marta, a personagem principal é professora Universitária, na Beira Interior.
A pedido de um colega seu da Universidade de Évora desloca-se a esta cidade.
Até aqui, tudo certo. Vamos com ela de viagem e descobrimos um pouco quem é a Marta.
É uma mulher só, com uma infância triste e sem graça, com uns pais ausentes na alma e com a companhia de uma tia-avó que lhe enchia os dias de sonhos.
A frase inicial é dessa tia-avó que Marta nunca esqueceu.
Foi nos livros que encontrou o conforto, mas tímida de espírito nunca pôs em prática o sonho de escrever.
Escrever, escrevia alguma coisinha que guardava no fundo dos seus ficheiros do computador.
Nessa viagem que faz a Évora, muitas coisas estranhas lhe acontecem.
Janta com um casal que é tudo menos normal, passa por um morto que lhe pede boleia duas vezes e que trás um livro consigo, passa uma noite de medos num convento que foi transformado em Hotel e encontra no outro dia o mesmo rapaz que já está morto e era um estudante daquela Universidade. Ele, deixa-lhe o livro que trazia na mão.
O livro escreve os seus passos e ela pode ver aquilo que aconteceu. É como se o livro estivesse a ser escrito ao mesmo tempo que ela vive.
Ao voltar para a Beira Interior, Marta pára em Monforte e fica num quarto de hotel durante uma tarde. Precisa de escrever o que se passou com ela nas últimas horas. Nem ela sabe a que se deve a urgência daquela necessidade, e quando desce para ir comer qualquer coisa, - afinal não se consegue ver ao espelho - descobre nas noticias da TV, que morreu no dia anterior. Que o seu carro caiu ao rio num acidente com um camião e que procuram o seu corpo.
Ela já morreu e não foi informada. Até porque continua ali, as pessoas continuam a vê-la e a falar com ela.
Marta está perdida no seu próprio labirinto, e ao voltar para o quarto lembra-se que em tempos escreveu um conto, em que um homem acorda e não se consegue ver ao espelho, que descobre que está morto na cama, mas que as outras pessoas o conseguem ver.
Procura esse conto nas pastas esquecidas dos seus ficheiros de computador e ao lê-lo, vem-lhe à ideia que se voltar a reescrever a história daquele dia poderá também ela mudar o que se passou.
É assim que Marta inventa uma história na ponta dos seus dedos. Escreve que não existiu nenhum acidente com um carro igual ao dela, e que o motorista do camião que esteve envolvido é apenas um homem alcoólico com um passado de acidentes e que não poderia ter outro. Perante as autoridades cria esta história fantabulesca de um carro que lhe surgiu em contramão e que caiu ao rio, para poder manter o emprego e a sanidade.
É a forma que ela têm de se salvar da morte.
Convencida que tudo passou a ser como a história que contou, pois até os noticiários já falam na possibilidade de não ter existido carro nenhum, Marta deixa Monforte e caminha para a Beira Interior.
Está tão convencida de si, que decide voltar para casa pelo mesmo local onde tinha morrido ontem. Afinal, já tinha resolvido isso.
Mas a vida e a morte são estados bem definidos e Marta não foge ao seu destino.
É bastante interessante.
Nunca li este autor.
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