José Saramago
Hoje não venho falar de um livro em particular mas de José Saramago.
O escritor particular. Não um escritor, mas O escritor.
Hoje comemora-se 10 anos sobre a morte de Saramago, e o meu post de hoje, não é para falar da Terra de Pecado, ou do Manual de Pintura e Caligrafia, nem do Levantados do Chão, tão pouco do Ano da Morte de Ricardo Reis. Também não quero falar de O Evangelho segundo Jesus Cristo, nem de Todos os Nomes, nem do seu Discurso de Estocolmo, muito menos do Conto da Ilha desconhecida.
Ficará para outro dia falar de O Homem Duplicado e de As Intermitências da Morte.
A minha vontade de ler começou cedo, mas a minha vontade de ler José Saramago não.
Atravessei toda a minha adolescência e grande parte da minha idade adulta a colocar de lado qualquer titulo que me aparecesse de José Saramago.
O único livro que comecei a ler foi o famoso Memorial do Convento, que na altura não estava inserido no programa escolar, mas não passei dos primeiros capítulos completamente desiludida com a narrativa.
A polémica em volta de O Evangelho segundo Jesus Cristo, provocada pelo Governo de Cavaco Silva não ajudou e as "farpas" trocadas com António Lobo Antunes, meu escritor de eleição nessa época moldaram e distorceram a minha opinião sobre o escritor.
Nós mudamos tanto ao longo dos anos... é difícil prever quais serão as nossas mudanças.
Há alguns anos, creio que em 2017, a minha irmã fez uma viagem a Lanzarote, visitou a casa de Saramago, a Biblioteca onde escrevia e todas aquelas imediações, e veio de lá no mínimo eufórica, deslumbrada e completamente apaixonada por Saramago. Trouxe impresso o Discurso de Estocolmo que me emprestou e já fazia projectos dos livros que queria comprar e ler.
Estranhei tanta euforia e depois entranhei...
Movida pelo entusiasmo comprei As Pequenas Memórias num alfarrabista numa feira e deixei-me levar pela criança que fui.
Não sei se comecei pelo melhor ou pelo pior, sei que As Pequenas Memórias antes de ler e ver as histórias de Saramago permitiu-me ver e ler o escritor.
Dentro do ar altivo e a raiar a arrogância que mais não era do que timidez, estava um ser humano que tinha tido uma infância igual aos meus avós e há minha mãe.
"A criança que eu fui não viu a paisagem tal como o adulto em que se tornou seria tentado a imaginá-la desde a sua altura de homem. A criança, durante o tempo que o foi, estava simplesmente na paisagem, fazia parte dela..."
Foi um bom começo, ou recomeço.
Hoje a minha relação com José Saramago é de profundo respeito e admiração. Aos poucos fui lendo outras obras do escritor e as ideias ataviadas que tinha foram-se dissipando e esfumando para o buraco da vergonha.
Compreendo hoje, que muitas vezes fazemos juízos de valor baseados em ideias importadas de outros e que nem sempre temos a coragem ou a vontade de tentar perceber a sua razoabilidade.
Vivemos presos pela opinião dos outros. Temos dificuldade em nos separar dos rebanhos.
"Não se sabe tudo, nunca se saberá tudo, mas há horas em que somos capazes de acreditar que sim, talvez porque nesse momento nada mais nos podia caber na alma, na consciência, na mente, naquilo que se queira chamar ao que nos vai fazendo mais ou menos humanos."
A minha prateleira José Saramago, hoje está quase completa e de vez em quando acrescento um titulo do escritor ás minhas leituras. Aos poucos lá vou preenchendo as lacunas de anos e anos de ausência, mas desgraçadamente não consegui acabar O Memorial do Convento...não consigo, não consigo.
Compartilhando a opinião no Blog literário da WOOK, "José Saramago, um dos mais importantes escritores portuguesas e um dos maiores romancistas da segunda metade do século XX, morreu há precisamente uma década. Ainda que ele nos tenha deixado, continua entre nós. Porque algumas pessoas morrem e outras, não."
Deixo-vos um paragrafo (mais um!), do livro As Pequenas Memórias, para nunca nos esquecermos que mesmo por detrás de um escritor passou uma criança e aquilo que nós fomos, é aquilo que nós somos.
"Não sei como o perceberão as crianças de agora mas, naquelas épocas remotas, para as infâncias que fomos, o tempo aparecia-nos como feito de uma espécie particular de horas, todas lentas, arrastadas, intermináveis. Tiveram de passar alguns anos para que começássemos a compreender, já sem remédio, que cada uma tinha apenas sessenta minutos, e, mais tarde ainda, teríamos a certeza de que todos estes, sem excepção, acabavam ao fim de sessenta segundos..."
Nós mudamos tanto ao longo dos anos... é difícil prever quais serão as nossas mudanças.
Há alguns anos, creio que em 2017, a minha irmã fez uma viagem a Lanzarote, visitou a casa de Saramago, a Biblioteca onde escrevia e todas aquelas imediações, e veio de lá no mínimo eufórica, deslumbrada e completamente apaixonada por Saramago. Trouxe impresso o Discurso de Estocolmo que me emprestou e já fazia projectos dos livros que queria comprar e ler.
Estranhei tanta euforia e depois entranhei...
Movida pelo entusiasmo comprei As Pequenas Memórias num alfarrabista numa feira e deixei-me levar pela criança que fui.
Não sei se comecei pelo melhor ou pelo pior, sei que As Pequenas Memórias antes de ler e ver as histórias de Saramago permitiu-me ver e ler o escritor.
Dentro do ar altivo e a raiar a arrogância que mais não era do que timidez, estava um ser humano que tinha tido uma infância igual aos meus avós e há minha mãe.
"A criança que eu fui não viu a paisagem tal como o adulto em que se tornou seria tentado a imaginá-la desde a sua altura de homem. A criança, durante o tempo que o foi, estava simplesmente na paisagem, fazia parte dela..."
Foi um bom começo, ou recomeço.
Hoje a minha relação com José Saramago é de profundo respeito e admiração. Aos poucos fui lendo outras obras do escritor e as ideias ataviadas que tinha foram-se dissipando e esfumando para o buraco da vergonha.
Compreendo hoje, que muitas vezes fazemos juízos de valor baseados em ideias importadas de outros e que nem sempre temos a coragem ou a vontade de tentar perceber a sua razoabilidade.
Vivemos presos pela opinião dos outros. Temos dificuldade em nos separar dos rebanhos.
"Não se sabe tudo, nunca se saberá tudo, mas há horas em que somos capazes de acreditar que sim, talvez porque nesse momento nada mais nos podia caber na alma, na consciência, na mente, naquilo que se queira chamar ao que nos vai fazendo mais ou menos humanos."
A minha prateleira José Saramago, hoje está quase completa e de vez em quando acrescento um titulo do escritor ás minhas leituras. Aos poucos lá vou preenchendo as lacunas de anos e anos de ausência, mas desgraçadamente não consegui acabar O Memorial do Convento...não consigo, não consigo.
Compartilhando a opinião no Blog literário da WOOK, "José Saramago, um dos mais importantes escritores portuguesas e um dos maiores romancistas da segunda metade do século XX, morreu há precisamente uma década. Ainda que ele nos tenha deixado, continua entre nós. Porque algumas pessoas morrem e outras, não."
Deixo-vos um paragrafo (mais um!), do livro As Pequenas Memórias, para nunca nos esquecermos que mesmo por detrás de um escritor passou uma criança e aquilo que nós fomos, é aquilo que nós somos.
"Não sei como o perceberão as crianças de agora mas, naquelas épocas remotas, para as infâncias que fomos, o tempo aparecia-nos como feito de uma espécie particular de horas, todas lentas, arrastadas, intermináveis. Tiveram de passar alguns anos para que começássemos a compreender, já sem remédio, que cada uma tinha apenas sessenta minutos, e, mais tarde ainda, teríamos a certeza de que todos estes, sem excepção, acabavam ao fim de sessenta segundos..."
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