16 de fevereiro de 2022

 


VALE A PENA? CONVERSAS COM ESCRITORES - INÊS FONSECA SANTOS



Foi uma pequena surpresa este livro de ensaios.
Adquiri-o na leve esperança de compreender o que transborda na alma de um escritor.
Se são loucos ou génios, ou se a sua vida, abnegada e povoada de obsessões pela escrita os consome diariamente.
Deparei-me com algo bem maior do que isso e subjuguei o meu pensamento.
Várias palavras a quem não damos o devido valor.
Literatura, literatura de entretenimento, arte, cultura, leitura, criatividade, curiosidade, inquietude, conhecimento.

Como devem de compreender o meu pequeno exemplar desta edição da Fundação Francisco Manuel dos Santos, está povoada de Post´it, povoada de frases sublinhadas e de notas pessoais de rodapé.
A palavra profissão não encaixam neste universo de renuncia e ideias fixas, esta perseguição diabólica pela palavra escrita, pelo contexto, pela história, o enredo e as personagens.
Ser escritor não vem na folha de recibo do vencimento. Não é algo que se aprende na escola. É algo que se traz dentro do corpo. 
Esse caminho, esse ADN como diz Afonso Cruz está no sangue e na alma e um escritor não pode renunciar a ele. Pode fugir-lhe. Pode chegar-lhe aos quarenta sempre a fugir-lhe, mas acabará por enfrentá-lo.

Este livro é um ensaio de conversas entre Inês Fonseca Santos, jornalista e também escritora com outros escritores.
O livro, atropela as suas opiniões sobre o que é ser escritor, o papel dele na sociedade, o que é ou não literatura.
Confesso que a minha opinião por vezes não é tão linear.
O conceito profissão de "escritor". o mercado editorial, o papel dos editores e das editoras. E o leitor.
Aquele que é o "companheiro de percurso" do escritor. Aquele que Mário de Carvalho designa por "aquela pessoa que faz o livro connosco. O leitor traz a sua vida, a sua vivência pessoal, traz tudo o que leu, traz os filmes que viu, etc, e faz com isso um livro."

Muito se poderá dizer sobre este livro. O seu despreendimento e a capacidade de redenção que apresenta é tremenda.
Aquele caminho que tem de ser percorrido, coloca o escritor num patamar diferente da maioria.
Escrever é mais do que uma profissão ou tendência.
Escrever é uma obsessão para quem o faz, feita de resiliência e impossível de partilhar.
É um ato de solidão e isolamento. É um ato de abandono, sem a devida retribuição pecuniária.
Quem se entrega a isto só pode estar louco.
É uma bênção termos tantos loucos! 


"A leitura é uma espécie de celebração mágica. É a maneira de paradoxalmente descobrirmos que a realidade é aquilo que sonhamos e não aquilo que temos entre mãos. É essa espécie de travessia de continentes. Que não existem. E nos quais reconhecemos aquilo que é mais profundo em nós e que não pode ser dito."

"A escrita nasce de uma pulsão íntima, sempre singular, mas corporalmente evidente e irrecusável, traduzida na necessidade de escrever diariamente ou quase diariamente."

"Escrever não é só escrever, é ler, não fazer nada, é estar atento, esperar."

"Os livros são bocados de carne de uns que invadem a vida de outros. São objectos de alma inqualificáveis e não identificáveis mas indispensáveis à sobrevivência humana. Quem se dedica a este ofício é certamente louco, e tem também uma costela de missionário."

"Nenhum escritor que se preze escreve para um público, nenhum escritor que se preze escreve uma obra-prima para ganhar a vida, nenhum escritor que se preze sabe por que ou para que escreve e, no entanto, nenhum escritor que se preze pode parar de escrever."




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