Autobiografia - José Luis Peixoto
José Luis Peixoto tem um cantinho especial nas minhas estantes de livros. É aquele autor que eu descobri na adolescência e que povoou a minha maturidade com toda a sua melancolia.
A sua melancolia alimenta-me, e eu preciso muito de alimentar estes sentimentos. Faz parte de mim... adoro a sua melancolia.
Gosto muito dos seus romances e "Nenhum Olhar", terá no próximo ano uma releitura. E eu não sou muito de reler.
Para quem não sabe, José Luis Peixoto ganhou o Prémio Literário José Saramago com o referido romance "Nenhum Olhar". Vai fazer parte da série que está em exibição na RTP 1, sobre os herdeiros de Saramago. Alguns não conheço o seu trabalho e outros como José Luis Peixoto sou fã.
Voltando ao "Autobiografia" este livro é fantástico e como já não lia Peixoto à algum tempo foi muito agradável concluir que entre nós os dois nada mudou. A sua extraordinária forma de contar uma história e a minha grande vontade de ler e admirar aquilo que Peixoto escreve.
Depois! Ainda temos José Saramago como personagem.
Estou aqui a dar a minha opinião sobre "Autobiografia", mas gostaria também que vos recomendar como leitura também "Nenhum Olhar" de Peixoto e "Manual de Pintura e Caligrafia" de José Saramago.
"Contar-me a mim próprio através do outro e contar o outro através de mim próprio, eis a literatura."
Esta Autobiografia é a história de um escritor que se vê a braços com a falta de inspiração para o seu segundo livro. O chamado síndroma da página em branco.
A personagem principal "José", autor de um livro já editado e com relativo sucesso, encontra-se a braços com a falta de inspiração para um segundo livro e a par disso vê a sua vida a desmoronar na incapacidade de se manter útil e sustentar-se a si próprio.
Este mantém uma amizade com um idoso com tiques de loucura, que o vai preservando à tona da sobrevivência.
José recebe um convite do seu editor para escrever a Autobiografia de José Saramago. A principio José não vê o convite com bons olhos, mas as suas opções futuras não são muitas e este acaba por aceitar escrever o livro. Para o escrever tem de se encontrar com alguma regularidade com José Saramago que não lhe pretende abrir a sua vida como um livro mas espera de José algo bem diferente.
José Saramago publicou o seu segundo romance trinta anos depois do primeiro.
"Terra de Pecado" editado em 1947 e o segundo romance precisamente "Manual de Pintura e Caligrafia" editado em 1977.
É o principio do contar-me a mim próprio através do outro e contar o outro através de mim próprio.
O livro coloca as personagens em camadas e quando estamos a ver o José, ninguém nos garante que não estamos a ver o José Saramago naqueles trinta anos de páginas em branco.
Transformar o próprio José Saramago numa personagem de um livro é um desafio, e só posso dizer que o livro é interessantíssimo.
É como se o mestre indicasse ao seu discípulo qual a estrada por onde este deveria seguir, mas tivesse ficado no inicio do cruzamento. O caminho só pode ser percorrido por nós próprios.
Para mim é uma obra essencial na procura da identidade de quem escreve. Uma homenagem diferente também ao grande escritor que foi José Saramago.
"José conseguiu certos pensamentos, nunca se imaginara biografo, não era biografo; precisava de um segundo romance escrito, eis o que lhe faltava para recuperar algo a que não sabia dar o nome. Ansiava pelas páginas desse romance invisível, cada palavra a ser uma montanha, pesada difícil de escalar, a cobrir o horizonte e, ao mesmo tempo, a ser o horizonte."
Já vos disse que a seguir li "Manual de Pintura e Caligrafia"? De José Saramago!
Pois foi! É uma história completamente à parte daquilo que já li de José Saramago. É magnífico.
Muito bom!
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