18 de fevereiro de 2021

 


ANATOMIA DE UM ESCÂNDALO - SARAH VAUGHAN



A contra- capa deste livro, foi meio caminho andado para eu tomar a decisão de o trazer para casa.
"A verdade é um conceito complexo." Deveras! Aquilo que é a verdade para mim, não é para o outro.
E nesta anatomia o conceito toma caminhos distintos.
Escrito a várias vozes, vamos conhecendo as personagens e o que as move. A história em si, ganha força quando cada um mostra as suas fragilidades.
Quem entra nesta equação?

Kate Wooderoft, advogada de acusação, que acima de tudo não gosta de perder. Mais do que a possibilidade de ganhar numa sala de audiência, move-a uma forte capacidade de justiça e uma extrema noção da realidade das classes sociais inglesas. Tem em si, uma capacidade de humanidade pelos outros (vítimas), mas faz o que tem de fazer.
É caso para perguntar, o porquê desta tal capacidade e humanidade.

James Whitehouse, ocupa um lugar no governo Inglês e é acusado pela sua amante e assistente de violação. Nesta fase do livro, não consigo defini-lo. Não consigo manter uma opinião sólida da sua culpa ou inocência. Demasiado incaracterístico.
A sua personagem é escorregadia e aparenta uma culpa apenas aparente mas que não é sentida no seu âmago.
Creio que é assim que a escritora que manter-nos em relação a ele. O que quer que seja que tenha de ser revelado sobre ele, será não agora mas mais para a frente.

Sophie Whitehouse, a mulher traída. A mulher de James que tem de levar com a porcaria toda por tabela, e ainda aparentar uma total disponibilidade em apoiar a inocência de James.
É uma personagem que se alimenta dentro do limbo, da dúvida que se vai criando. É onde terminam todas as emoções.
O seu mundo desmancha-se num abrir e fechar de olhos, e a nós leitores só nos resta assistir a esse "apanhar de cacos".
Todas as suas atitudes e decisões influenciam a trama e ela é completamente encostada à parede. Quem consegue suportar isso? É depois, há a dúvida!

Holly, esta personagem vem do passado, no tempo da Universidade de James e Sophie. Nesta altura do livro, ainda não consegui perceber qual a sua função. Mas que é importante, é!
Vamos continuar!

Ok! As peças deste puzzle começam a encaixar de forma subtil.
Holly não é mais do que a versão Kate Wooderoft no seu primeiro ano da Universidade, num ambiente desproporcional ao seu mundo e à sua classe social.
E sim, James nessa época violo-a.
Sophie a sua esposa incondicional, começa a vacilar perante a dúvida. Porquê Sophie duvida, porquê?
Sophie sabe quando James mente, mas desesperadamente não quer acreditar.
"determinada a acreditar em qualquer coisa porque é a explicação mais ditosa, ainda que menos credível. Emily acredita na fada dos dentes, tal como Sophie acredita que James nunca teria usado aquela frase, porque é nisso que ela quer tão desesperadamente acreditar."
Onde estará a verdade? Vamos continuar!

E James é absolvido como se os escolhidos fossem eternamente intocáveis e privilegiados. Nunca acreditei que ele fosse condenado. Isto se a escritora quisesse ser o mais fiel possível à realidade humana.
Contudo a dúvida instalou-se e Sophie quando volta para casa com um marido empolgado e aliviado, confronta-o sem medos, incapaz de suportar mais aquela situação.
"Abandona a sala aos apalpões, pernas pouco firmes, visão desfocada; concentrando-se apenas em sair dali antes de se ir abaixo por completo (...) Senta-se na tampa da sanita e deixa que o horror se apodere dela; sente um gemido querer agigantar-se, mas cala-o com o punho. O seu marido é um estranho."
Sophie é uma mulher completamente ultrapassada pelos acontecimentos. Uma mulher que dá conta que a sua própria vida foi um desperdício e que a sua lealdade é pouco valorizada. 
Nem sequer foi verdadeiramente amada e respeitada.
James não passa de um menino egoísta e egocêntrico a quem a vida sempre correu bem, mas Sophie ainda vai demorar algum tempo a processar toda esta realidade.
A atitude final de Sophie não me surpreende e mostra a sua capacidade de recomeçar e não! as mulheres não tem pouca convicção! As mulheres tem convicção para o que é realmente necessário.
Deparamos com várias realidades neste livro. A supremacia e a intocabilidade das classes privilegiadas. O papel das mulheres nesta sociedade de homens com desejos e vontades. A facilidade como uma mulher é condenada por ser "tão oferecida", e a forma como os homens são consecutivamente desculpados nos seus atos.
Deveras intrigante, profundamente revelador...
O fim deixa-nos uma esperança que talvez desta vez ele não se safe.
Mas é apenas uma esperança.




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