23 de março de 2022

 


AUTOBIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA - DULCE MARIA CARDOSO



"Sinto-me perdida nesta irrealidade. Alguém sabe dizer-me, por favor, como faço para ir para casa?"

Este livro reúne algumas crónicas de Maria Dulce Cardoso publicadas na Visão.
É uma escritora que eu admiro. O seu "Eliete" está entre os meus livros preferidos. Vivo com a esperança que aquele (livro I) queira dizer que a "Eliete" tem continuação.
As crónicas cirandam entre a sua infância, a sua vida em África, o seu retorno, os seus sentimentos a esta palavra e condição de retornada.
Visivelmente marcada em tudo o que escreve.

A maioria de nós, seres humanos que cá andamos, ainda não compreendeu que as oportunidades de cada um são desfasadas.
Que fechar a porta da casa, deixar lá tudo o que se construiu e voltar, fugir, para outro lugar qualquer, com a roupa do corpo e pouco mais, ainda é uma realidade permanente.
Nos dias que correm, assustadoramente constante.
Que existem vidas, cuja própria existência está suspensa.
Sair dessa realidade e construir outra camada da própria vida tem o lastro de qualquer terramoto.
É apenas um exercício de imaginação aquilo que faço depois de ler estas crónicas da Dulce. A prática de exercer com a mente aquilo que eu não alcanço com o corpo e com o meu espirito. Sim! Sou uma menina privilegiada. Quantos de nós seremos assim, cheio de benefícios sem nos darmos conta.
Contudo, é isso que nos constrói, não a nossa vida pautada por uma linha de serenidade e despreendimento. 
Nunca aprendi com o beneficio, com a sorte, com a benesse. As contrariedades tem sempre uma lição de estudo e se conseguirmos separar as camadas encontraremos uma conclusão.
Desculpem-me este desvio do tema principal, por vezes perco-me.

Dulce Maria Cardoso é daquelas escritoras em que vale a pena ler. Peguem em tudo, que é bom.
As edições da Tinta da China dão-lhe um toque sofisticado. 
As cores que se misturam, o cuidado das cartolinas de cor no inicio e no fim. Um toque de arte para além da arte. Já falei sobre isso ontem.
E os seus desabafos de menina irrequieta, os seus medos de menina crescida, os dias do Covid-19 explicados sorrateiramente. O retorno. E o amor. 

"Apesar do sofrimento, a beleza deste episódio noturno entranhou-se em mim e estas imagens passaram a habitar-me como se as tivesse presenciado. A beleza é indiferente à dor. Por isso vigio-a."
 

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