MRS.DALLOWAY - VIRGINIA WOOLF
A expectativa era grande quando peguei neste livro.
Virginia Woolf despertou-me a curiosidade com o seu "Um quarto só para si".
Isto em Setembro do ano passado e eu ainda a falar deste seu pequeno e profundo ensaio.
Confesso que quando iniciei esta leitura senti-me um pouco perdida e fechei o livro logo depois, com 28 páginas lidas.
Tinha um misto esponjoso que se dividia entre "não era bem isto que eu estava à espera" e "não pode ser só isto a escrita de Virginia Woolf"
Peguei nele no dia seguinte. Domingo à tarde. A tarde toda. Para dizer-vos a verdade, nem eu percebo muito bem porquê!
Nota de rodapé; nunca avaliar um livro pelas primeiras páginas!
Posso dizer que já não lia compulsivamente faz tempo. Aquelas leituras em frente à lareira, num Domingo que devia de chover e não chove e que o caminho é só um. As páginas de um livro.
Nada mais existe. Só as páginas de um livro.
Esta é a história de Mrs. Dalloway. O enredo centra-se num dia específico da sua vida e das personagens que a rodeam.
Mrs. Dalloway situa-se na década de 20 do século passado e a trama desenrola-se em Londres num dia de festa.
Mrs. Dalloway faz parte da sociedade londrina e um dos seus maiores prazeres é receber em festas organizadas por si.
Este dia situa Mrs. Dalloway com mais de cinquenta anos e como consequência todos os seus amigos estarão também eles a atravessar essa perigosa idade.
Digo perigosa, porque o livro caminha para o perigo do pensamento como um todo. O livro retrata a condição humana; o que somos. Aquilo que nos alimenta a alma. O que nos faz progredir ou estagnar.
Os nossos próprios pensamentos, a loucura ou a sanidade que trazemos cá dentro.
No fundo é um livro de reflexão sobre o que cada uma das personagens foi e será, os seus gestos e pensamentos profundos. Quando este intrincado se desenrola como um novelo de lã perseguido por um gato a história deixa de ter escapatória possível e sim! Eu fiquei agarrada a ele e não sei porquê!
Mrs. Dalloway é a personagem central, mas quem gravita à sua volta tem a possibilidade de expor-se.
É um livro sobre sensações e pensamentos. Sobre fragilidade, escrita de forma subtil e magistral que me prendeu sem eu dar por isso.
Admito que fiquei enredada sem dar conta. Indisponível para o resto, não para compreender até onde Clarisse Dalloway rasgava o seu mundo com a sua própria inevitabilidade, mas para ler o ruído daquelas vozes sussurrantes que esbatiam a sua alma humana cheia de contradições.
O seu entendimento para algo tão substancial e necessário como a solidão, o impulso, a passividade, a dignidade, a independência, o respeito, os valores inestimáveis, a tolerância e a simplicidade.
Tudo o que trazemos cá dentro desfiado num conjunto de personagens que nos cabem nos dedos das mãos.
Não sei se será o melhor de Virginia Woolf, ainda estou só no principio. Mas está pejado de profundidade.
"Tinha a estranha sensação de ser invisível; inobservada; desconhecida..."
"O mais estranho, ao olhar para trás, era a pureza, a integridade, dos sentimentos que nutria por Sally. Eram diferentes daquilo que se sente por um homem. Eram completamente desinteressados e, além disso, tinham uma característica que só podia existir entre mulheres, entre mulheres acabadas de amadurecer."
"Era essa a sua faceta diabólica - aquela frieza, aquela severidade, algo de muito profundo, que ele voltara a sentir naquela manhã ao falar com ela; uma impenetrabilidade. No entanto, Deus sabia o quanto a amava. Ela tinha o estranho poder de remexer nos nervos de uma pessoa, de os transformar nas cordas de um violino."
"Tinha uma noção perfeitamente clara daquilo que queria. Todas as suas emoções se encontravam à superfície. Abaixo delas, era bastante perspicaz - era, por exemplo, muito melhor do que Sally a avaliar o carácter das pessoas, sem deixar de ser puramente feminina; com aquele dom extraordinário, aquele dom de mulher, de criar um mundo só dela onde quer que se encontrasse."
"Pois ela chegara à conclusão de que só valia a pena dizer-se uma coisa - o que se sentia. A inteligência era uma tolice. Devia apenas dizer-se o que se sentia."
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